Por Edilson Silva No último dia 18 de maio a ex-senadora Heloisa Helena, presidente nacional do PSOL, esteve em Pernambuco, para uma agenda no sertão.

De passagem pelo Recife, teve um encontro com o ex-ministro Armando Monteiro Filho.

Certamente alguns estranharam o encontro, afinal, a líder nacional de um partido de esquerda e socialista, conhecido por sua radicalidade, supostamente não teria muito o que conversar com um personagem político que é também um empresário, que pela definição de classe social guardaria algumas barreiras intransponíveis com o PSOL.

Mas a idéia do encontro, que reuniu além de Heloisa Helena os presidentes regional e municipal do PSOL/Recife, respectivamente Edilson Silva, pré-candidato a prefeito do Recife, e Alexandre Santos, este último também presidente do Clube de Engenharia de Pernambuco, além do advogado José Roberto Cavalcanti, do conselho político da candidatura do PSOL à prefeitura do Recife, tinha também o objetivo de romper alguns dogmas.

As lideranças nacionais e locais do PSOL foram ao encontro de Armando Monteiro Filho para efetivar um gesto que simbolizasse nossa distinção à sua personalidade política, à sua história, e ao mesmo tempo atendendo à reciprocidade manifestada por ele para com o projeto político liderado por Heloisa Helena.

O encontro permitiu-nos confirmar a singularidade da figura do ex-ministro.

O homem que compôs um governo que condecorou Che Guevara e que foi vítima da trama que culminou com o golpe de 64, e que é amigo pessoal de Fidel Castro, recebeu-nos presenteando Heloisa Helena com um anteprojeto de Reforma Agrária preparado por ele em 1962, quando era o então Ministro da Agricultura de João Goulart.

O anteprojeto, que chegou a ser aprovado pelo Conselho de Ministros do governo, chefiado à época por Tancredo Neves, fazia parte das reformas de base de Jango, mas não conseguiu vencer o conservadorismo do Congresso Nacional.

O conteúdo do anteprojeto, com suas considerações embutidas, revela um político e ministro a frente de seu tempo.

O combate ao latifúndio e ao feudalismo hegemônicos no campo, buscando devolver à propriedade da terra sua função social, era o objetivo central de sua Reforma Agrária.

A taxação fortemente progressiva sobre as grandes propriedades rurais, através do ITR (Imposto Territorial Rural), para viabilizar recursos para as desapropriações, engendrava uma inteligente e gradativa reestruturação da estrutura fundiária num Brasil que ainda possuía 70% de sua população vivendo fora das grandes cidades.

Tivesse o Brasil assimilado as propostas do então ministro da Agricultura, talvez hoje o caos social e a favelização não fossem tão contundentes nas grandes e médias cidades brasileiras, causando toda sorte de chagas que se abatem com mais força sobre as massas urbanas.

Diante da negativa do país, através de suas elites retrógradas - que depois se revelaram também golpistas, em assumir um projeto minimamente coerente de desenvolvimento social e econômico sustentáveis, quase meio século depois o ex-ministro percebe, com ressalvas obviamente, os movimentos de trabalhadores sem-terra como uma resposta legítima dos despossuídos.

Nos dias atuais, a essência da proposta do ex-ministro continua na ordem do dia, até porque os problemas de cinqüenta anos atrás não foram resolvidos, e muitos deles foram inclusive ampliados.

A estrutura fundiária não se alterou, e continua expulsando as populações campesinas para as grandes cidades.

Além disso, entra em cena o tema da crise dos alimentos, que torna o debate ainda mais contemporâneo.

O diálogo de Heloisa Helena e dos demais dirigentes do PSOL com Armando Filho foi, portanto, antes de tudo um diálogo republicano, apesar das “cores” diferentes, somente possível entre biografias que têm na coerência política a condição indispensável do fazer político.

PS: Presidente do PSOL/PE e pré-candidato à prefeitura do Recife