Além de soterrar as versões divulgadas até agora para tentar explicar o dossiê, o envolvimento do secretário de Controle Interno no caso acabou por consolidar algumas verdades.

A principal delas: o dossiê existe, foi feito nos gabinetes da Casa Civil e tem 27 páginas de informação que chegam ao requinte de detalhar despesas minúsculas do presidente, da primeira-dama e de alguns assessores com o objetivo de constranger e chantagear.

Os dados estão organizados em uma mensagem enviada do computador de José Aparecido para o também auditor André Eduardo da Silva Fernandes, lotado no gabinete do senador Alvaro Dias, de acordo com a perícia feita por técnicos do próprio Palácio do Planalto.

Os dois são amigos e têm em comum o fato de ter militado no PT.

André, aliás, já foi até ghost writer do presidente Lula, escrevendo artigos que o então presidente do PT publicava nos jornais.

Em fevereiro, no auge dos debates sobre a instalação da CPI dos Cartões Corporativos, José Aparecido, que foi nomeado para o cargo pelo ex-ministro José Dirceu, e André, que hoje é filiado ao PSDB, trocaram várias mensagens e telefonemas sobre o assunto.

Em um deles, datado de 20 fevereiro, José Aparecido encaminhou voluntariamente a cópia do dossiê.

A existência da mensagem foi revelada pelo Jornal Nacional, da Rede Globo. “Era a prova de que os boatos que circulavam no Congresso eram verdadeiros.

Interpretei isso como um recado para o PSDB sobre o que apareceria se a oposição não parasse de investigar as contas sigilosas do governo”, disse a VEJA o assessor do senador Alvaro Dias.

O arquivo contendo o dossiê, aliás, tem o sugestivo nome de Suprimento de Fundos – o mesmo apelido que ganhou o amplo e famoso banco de dados montado pela Casa Civil com fins meramente administrativos, segundo garante a ministra Dilma Rousseff.

Em vez de punição, o que prevalece nos bastidores é o empenho em negociar um acordo que permita a melhor saída possível para todos os envolvidos – um comportamento típico da sociologia petista.

Para não revelar a cadeia de comando que ordenou a produção do dossiê, José Aparecido exigiu que a Polícia Federal não o indiciasse em inquérito e que a investigação administrativa da Casa Civil se limitasse a caracterizar o episódio, no máximo, como uma pequena “infração administrativa”.

Feito isso, por decisão pessoal, ele deixaria o cargo e voltaria a exercer suas funções de auditor do Tribunal de Contas da União.

O governo parece ter topado o jogo.

Na quarta-feira passada, quando já se sabia da participação de José Aparecido, ao falar sobre o dossiê no Senado, Dilma Rousseff deu mais uma versão para o caso e contrariou tudo o que ela mesma havia afirmado sobre o tema.

A ministra declarou que os dados sigilosos de Fernando Henrique e sua família não são mais sigilosos.

Se essa interpretação for mantida, abre-se caminho para salvar a cabeça de José Aparecido Nunes Pires, inclusive na esfera penal, e evitar que ele conte o que sabe.

Desde o início do escândalo, o governo defendia uma investigação rigorosa e dirigida para caçar o vazador, apesar de seu papel secundário.

Estranhamente, depois da identificação do tal personagem, há uma evidente mudança de comportamento.

Uma cautela que parece exagerada para quem achava que o caso estaria solucionado a partir dessa revelação.

José Aparecido continua respondendo pela Secretaria de Controle Interno e não passou pela cabeça da ministra Dilma Rousseff, ao menos até a noite de sexta-feira passada, afastá-lo de suas funções.

Da Veja