Por Sérgio Augusto Silveira* É natural que dentro do Congresso Nacional falem mal das medidas provisórias editadas – impostas – pelo presidente da República.
Note-se que, dentro da nossa ordem institucional, tida como superadora do autoritarismo e que completa 20 anos de vigência, as medidas provisórias não ferem disposição alguma.
Por que?
Porque a política brasileira é culturalmente autoritária, desde a fase colonial até hoje.
Essa tendência , esse ranço persiste, apesar da Proclamação da República acontecida há 119 anos, apesar da dita Revolução de 30 (civil-militar), apesar das redemocratizações de 1946 e 1988.
Fazendo essa retrospectiva, não fica difícil entendermos o motivo pelo qual o poder Executivo, aliás, os presidentes da República na democracia à brasileira, arranjaram um jeitinho – escancarado – de driblar a ordem entre os poderes.
Esse drible a título provisório só na letra, existe para impor, de modo imperial, as decisões do presidente.
Alguma dúvida sobre isso?
Incrustada nas letras da nova Constituição – no trato das relações Legislativo/Executivo – a medida provisória(assim mesmo, sem inicial maiúscula) – está cumprindo cada vez com mais intensidade o objetivo para o qual foi criada.
O número de medidas provisórias, de presidente para presidente, se multiplicou.
Os presidentes – seja de que lado ideológico ou partidário for – editam essas medidas com uma fúria ditatorial.
Eles curtem as delícias de se impor acima do equilíbrio entre os poderes.
Como é bom obter logo o que se deseja!
Os imperadores, aliás, os presidentes brasileiros foram e são pródigos nisso.
Como lembra o colunista político Inaldo Sampaio, na edição do Jornal do Commercio, edição de domingo último, o presidente Fernando Collor, primeiro eleito após a Constituinte de 1988, editou 89 medidas provisorias.
Itamar Franco, em seu curto período, quase dobrou esse número, chegando a 142.
Em seus dois mandatos, Fernando Henrique Cardoso editou nada menos que 365.
E Lula da Silva, até a metade de seu segundo mandato, já está em 319 medidas provisórias editadas.
Negociador em qualquer circunstância, descaracterizado em face do papel que deve desempenhar, o Congresso Nacional quase só tem dito sim aos presidentes, no que toca às ordens, aliás, às decisões vindas do Palácio do Planalto.
E isso não surpreende, levando em conta que a histórica cultura política permanece intocável.
O Brasil tem sofrido – de 20 em 20 anos – estremecimento e uma revirada na sua ordem institucional.
Completados agora 20 anos de instituída, a ordem da chamada Nova República tem, neste cenário de imperadores, mostrado que está cansada, superada, desmoralizada.
Revela-se também vítima e repetidora da velha e insuperável cultura política autoritária.
Em plena onda em favor de um “terceiro mandato” presidencial – outro viés autoritário – pode-se perguntar: o que fazer para superar essa cultura?
Quem souber, responda. *Jornalista