PROMISCUIDADE E CONIVÊNCIA Por Jayme Asfora* Em 2007, os gastos com cartões corporativos do governo federal somaram R$ 75,6 milhões, segundo o site Contas Abertas.

Entre 2003 e 2007, 7,7 mil organizações não-governamentais (ONGs) receberam R$ 12,6 bilhões do Tesouro Nacional.

Qual é o ponto em comum a essas informações?

De longe, é a necessidade de uma maior fiscalização sobre o destino desses recursos.

Hoje, o Congresso debate quem criou, por que criou e como foi criado o dossiê – e o seu conseqüente vazamento – sobre os gastos com cartões corporativos feitos pelo ex-presidente da República Fernando Henrique Cardoso e sua esposa, D.

Ruth.

Mas tamanho alvoroço vem deixando para trás a informação que deveria ser a mais importante: quanto foi gasto e de que forma foram utilizados esses cartões.

Assim como devem ser levantadas as informações sobre o uso dos cartões, no primeiro mandato, pelo atual presidente e seus ministros.

A população brasileira quer, e tem o direito, de descobrir os hábitos de consumo de seus mandatários custeados com verba pública – argumento que vem sendo combatido para imputar a prerrogativa do sigilo a esses gastos. É urgente saber se os cartões tiveram um destino institucional ou pessoal.

Esse o ponto mais importante e fundamental das discussões.

A utilização dos recursos públicos deve prezar pelo que determina o Artigo 37 da Constituição Federal: “A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de LEGALIDADE, IMPESSOALIDADE, MORALIDADE, PUBLICIDADE E EFICIÊNCIA.” Em relação às ONGs, os princípios devem ser os mesmos, levando-se em consideração que “o recurso transferido a entidades privadas sem fins lucrativos, mediante convênio, não perde a sua natureza de dinheiro público”, segundo já propagou o próprio Tribunal de Contas da União (TCU).

Essas organizações devem prestar contas do que foi recebido, tal como qualquer entidade de natureza pública, inclusive, realizando licitações para contratação ou aquisição de bens e serviços.

Está tudo no mesmo bojo.

Quem defende a prorrogação da CPI das ONGs não pode tentar impedir os trabalhos da CPI dos Cartões Corporativos e vice-versa. É preciso que as respostas sejam dadas e, para tanto, a população precisa cobrar a prorrogação dos trabalhos da primeira e a facilitação do acesso às informações por parte da segunda.

Não dá mais para empurrar, para baixo do tapete, os dados que nos chegam diariamente sobre o uso dos recursos públicos, oriundos do bolso de todos os contribuintes. É inadmissível aceitarmos gastos de R$ 470 mil na reforma do apartamento do ex-reitor da Universidade de Brasília (UnB), Timothy Mulholland, enquanto o acervo das quatro bibliotecas da mesma Unb não receberam o mesmo investimento.

As autoridades brasileiras, tanto do Executivo como do Legislativo, precisam se pronunciar sobre as farras dos cartões e a instrumentalização política das ONGs.

Todo cidadão tem o direito de saber, por exemplo, a opinião dos seus eleitos sobre se devem permanecer sigilosos, ou não, os gastos e despesas do Palácio da Alvorada ou daqueles realizados, em viagens, por qualquer ministro.

Seja do governo Fernando Henrique Cardoso, seja do governo Luiz Inácio Lula da Silva. É preciso que cada eleitor esteja atento às posições de seus deputados e senadores - bem como daqueles que hoje ocupam postos-chave nos Executivos Federal e Estaduais - para que seu representante não se esqueça do Artigo 1º da nossa Constituição Federal – que, em 2008, celebra 20 anos de sua promulgação: “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente”. *Presidente da OAB-PE, escreve para o Blog às quintas.