Por Amanda Tavares Uma notícia publicada no JC OnLine, na última sexta-feira, parecia mais uma daquelas relacionadas à educação em que a gente já sabe o desfecho da história.
O título, “Enem mostra abismo que existe entre ensino público e privado”, e os primeiros parágrafos, infelizmente, mais uma vez, mostram a triste realidade em que se encontra o ensino público no País, mais especificamente em Pernambuco.
Mas a repórter Inês Calado não limitou-se apenas a divulgar os baixos índices relativos à educação no Estado.
A partir dos resultados do Enem, comparou os resultados das escolas públicas e privadas.
A instituição particular que obteve média mais baixa no exame foi Henrique Dias, com 50,24.
De acordo com a matéria, das 117 escolas estaduais analisadas, apenas quatro obtiveram média maior do que a do Henrique Dias: o Centro de Ensino Experimental Ginásio Pernambucano (CEEGP) e as escolas Professor Trajano de Mendonça, Joaquim Xavier de Brito e Maciel Pinheiro.
Um detalhe da notícia me deixou muito feliz: tive a oportunidade de conhecer alguns dos profissionais da escola Trajano de Mendonça durante a greve de 2007.
Paulo Alexandre, Ranieri, Arlene e outros colegas me chamaram a atenção pela coragem de lutar e pelo desejo de mudança, virtudes que, na teoria, parecem ser bem comuns, mas quando se parte para a prática, sabemos que poucos são os que realmente cultivam esses ideais.
Nas assembléias, reuniões, passeatas e outros tipos de manifestações realizadas durante a paralisação, sempre nos encontrávamos.
Durante as conversas, dava para perceber que eles faziam parte de uma escola que contava com uma equipe unida e uma boa gestão.
E que conseguiam criar um ambiente agradável de se trabalhar, apesar de toda a falta de estrutura.
Tenho apenas três anos e alguns meses de experiência no Estado.
Durante esse tempo, lecionei somente em uma escola, mas, como repórter, já andei por várias: nas zonas Norte e Sul da capital, Região Metropolitana e interior.
Conheci muita gente que realmente faz jus ao título de educador, mas, infelizmente, não são poucos os casos de professores que se dizem “cansados”, “desestimulados”, “revoltados” e que assim justificam sua baixa freqüência e sua falta de compromisso com o trabalho.
A média da Trajano de Mendonça no Enem, 54.38, não foi das mais brilhantes, mas não há dúvidas de que representa uma vitória.
Afinal a escola ficou em primeiro lugar entre as estaduais.
Acima, somente instituições como o Colégio de Aplicação da UFPE, o Cefet, o Colégio Militar e o CEEGP (apesar desse último também ser da Rede Estadual, seria injustiça compará-lo com qualquer outra escola administrada pela Secretaria de Educação, já que recebe mais recursos e vive uma realidade bem distinta das outras escolas da rede).
Ao saber da notícia, a equipe da escola ficou feliz, mas não se via tanta empolgação. “Isso é resultado tanto do esforço da gestão, quanto da dedicação dos professores.
Da Secretaria de Educação, não recebemos nem os parabéns”, desabafa a diretora, Maria José Baracho.
A educadora afirma que não existem grandes segredos para se conseguir o resultado, mas, para ela, o princípio básico de tudo é o comprometimento de alunos, professores e dos outros funcionários. “Até o ano passado, o Governo não distribuía material didático para os alunos do ensino médio, mas os professores davam um jeito de copiar os assuntos no quadro, de fazer apostilas e pedir para que todos tirassem xérox ou de incentivar a freqüência dos alunos na biblioteca.
Cada um improvisava à sua maneira.
Mas nenhum deixava de passar o conteúdo”, garante.
A diretora conta que os docentes são muito cobrados em relação à freqüência e à pontualidade. “Se não tiver compromisso, convido para sair da escola”, diz.
De acordo com ela, as cobranças não são vistas como injustas pelos docentes e alunos.
Ao contrário, servem como incentivo. “Todos os professores têm, no mínimo, especialização.
São três mestres e cinco mestrandos.
Ninguém aqui se acomoda”, afirma.
Segundo a diretora, em todos os anos há alunos da escola aprovados nos vestibulares das universidades públicas do Estado.
Baracho ressalta que a atual gestão do Governo promoveu algumas melhorias na educação, mas os problemas ainda são grandes. “Sou diretora de escolas estaduais há 11 anos e este foi o primeiro em que vi começar com todos os professores em sala de aula.
Isso já é um grande avanço, mas ainda temos problemas sérios.
Há três turmas sem material didático.
O governo anuncia que as escolas estão informatizadas, mas o nosso laboratório de informática conta com apenas 10 computadores, número insuficiente para cerca de 1,6 mil alunos.
E há o problema mais grave, que é a falta de valorização do professor.
Como posso exigir mais de docentes que chegam a dar 15 aulas por dia para sobreviver?”, reivindica.
Pelo que foi descrito até agora, é possível perceber que não há nenhum projeto extraordinário na escola e que eles enfrentam as mesmas dificuldades que as outras.
Ainda assim, profissionais e docentes da Trajano de Mendonça merecem ser louvados.
Eles provam que é possível manter uma educação de qualidade quando se tem compromisso.
Dão uma verdadeira lição, não somente aos professores, mas ao funcionalismo público em geral no País.
Mostram que não estão no cargo apenas para “garantir um emprego seguro”, como fazem muitos por aí.
Cumprem o seu papel e, por isso, estão no seu direito quando fazem críticas e exigem melhorias.
Mesmo com todo o descaso, não somente do governo, mas da sociedade em geral, com a educação, felizmente, ainda não foi possível acabar com os bons profissionais.
Além, dos colegas da Trajano, sabemos que há muitos em outras escolas com os mesmos anseios.
Apesar de não estarem em evidência, todos merecem o reconhecimento, são verdadeiros heróis.
Mas temos que admitir que todos temos muito o que aprender com lições como essa.
Se uma boa parcela das 117 escolas avaliadas funcionasse como a Trajano, não haveria, somente, alunos com melhores notas no Enem.
As assembléias de professores, provavelmente, teriam mais participantes; o sindicato seria bem mais atuante e o governo, possivelmente, não iria encontrar tantas brechas para argumentar contra os docentes quando esses resolvessem reivindicar.
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