As epidemias da dengue tornaram-se cíclicas Por Dirac Moutinho Cordeiro (dmc@upe.poli.br) Como se sabe, o dengue é transmitido pela fêmea do mosquito Aedes aegypti, que também é o vetor da febre amarela.
Qualquer uma dessas epidemias está diretamente ligada à concentração do mosquito transmissor, ou seja, quanto mais desses insetos, mais doenças far-se-ão presentes.
O Aedes aegypti originou-se provavelmente na região Nordeste da África, espalhando-se para Ásia e Américas, em virtude do tráfego marítimo entre esses continentes.
No Brasil, constatou-se a presença do inseto por volta do século XVIII, provavelmente com embarcações que transportavam escravos, já que os ovos do mosquito podem resistir, mesmo sem contato com a água, por cerca de um ano.
Em 1955, uma grande campanha realizada pela Organização Pan-Americana de Saúde conseguiu erradicar o Aedes aegypti não somente no Brasil, mas na maioria dos países do continente americano.
Entretanto, por falta de recursos, a referida campanha não foi completa; sendo assim, o mosquito continuou presente nas ilhas caribenhas, especialmente, nas Guianas e na Venezuela, voltando a se espalhar para o Brasil, a Bolívia e Colômbia.
Já que o mosquito não foi erradicado do país, uma grande epidemia, no final da década de 1920, ocorreu no antigo Estado da Guanabara, hoje Rio de Janeiro, atingindo, posteriormente, todo o território nacional.
Na década de 1970, o Brasil figurava com um surto de dengue em suas principais cidades, provavelmente vindo do Caribe em pneus contrabandeados.
Em 2002, o Rio de Janeiro e Pernambuco foram notificados como os estados líderes da doença, tendo o primeiro o maior índice de ocorrências e óbitos.
Já em Pernambuco, o número de casos notificados em 1998 foi espantoso, representando cerca de 1,5% da população dos 14 municípios que definem a Região Metropolitana do Recife (RMR).
Vale ressaltar que essa região possui uma alta densidade populacional, além de um grande percentual de domicílios sem rede de esgoto e água encanada, restando à população usar reservatórios e pequenos recipientes no seu dia-a-dia.
A única garantia para o fim da dengue é a total ausência do vetor transmissor.
A Organização Mundial de Saúde (OMS) preconiza que há maior probabilidade de ser deflagrada uma epidemia quando os índices de infestação predial - número de imóveis amostrados com focos positivos de Aedes aegypti sobre o total de imóveis inspecionados - estiverem acima de 5%.
No entanto, não existe um limite inferior no qual se possa afirmar que não ocorrerão surtos de dengue.
Há mais de cinco anos, a fim de explicar o comportamento da série das notificações da dengue no estado de Pernambuco, elaboramos um modelo matemático, referente aos anos de 1995 a 2001, representado pela combinação de outros modelos de séries temporais.
Por meio de testes estatísticos, verificou-se que a componente sazonal (da estação) sobressai, isto é, tem grande influência na formação da série.
Já a componente tendência, pelo teste de Spearman, se aceita como nula.
As seguintes informações foram decorrentes da análise comportamental da série de interesse com base nas componentes estacionais e sazonais.
Já o cenário traçado apoiou-se na extrapolação dos resultados das previsões obtidas pelo melhor modelo, e aceitas pelos testes estatísticos adequados. 1) Pouquíssima possibilidade de erradicar a doença nos próximos 10 anos; 2) As estimativas das notificações para o curto prazo decresceram drasticamente, quando comparadas com os dois períodos de máximos; 3) As previsões para o curto prazo foram estáveis e, nesse caso, pode-se extrapolar o comportamento da série nesse curto período para um processo estacionário com pouca oscilação - a série tende a uma estabilidade em nível, isto é, a série das notificações do dengue converge para uma endemia controlada no médio e longo prazo; 4) Caso haja desequilíbrio entre as componentes estacionais e sazonais, não descartamos a probabilidade de uma nova explosão das notificações, gerando uma epidemia mais grave que as anteriores.
Lembramos que nas séries de forte componente sazonal, esse efeito passa a ser de suma importância principalmente como vetor contaminador de longo prazo, que é peculiar às séries epidemiológicas, notadamente, com as mesmas características comportamentais.
Não resta dúvida de que as instituições públicas necessitam informar e esclarecer a população, que existe um risco de epidemia desse agravo, uma vez que demandará muito tempo para que essa doença possa ser erradicada totalmente do nosso Estado.
PS: Dirac Moutinho Cordeiro é Professor de Métodos Estatísticos Computacionais - UPE Veja mais aqui.