Por Raul Jungmann Todas as manhãs a cena se repete.

Lucas Matheus, 6 anos, cai no choro quando seus irmãozinhos, Elisson de 9 e Larissa de 4, tomam café e, com seus livros e cadernos deixam a casa de dois cômodos pintada de azul na rua do Triunfo 657, no Arruda e vão para a escola.

Para D.

Nazareth, a avó, o ritual matinal é uma dor anunciada e repetida que não tem explicação nem sentido.

Para a mãe, Edjane, que hoje completa 29 anos, uma injustiça que lhe dá raiva e revolta.

Ela já percorreu 12 escolas das redondezas, sem sucesso.

Pediu, implorou, levou Lucas a tiracolo para ver se sensibilizava um diretor ou coordenador que fosse e nada.

A única saída, dizem, é matricular Lucas numa escola no centro.

Edjane, porém, não tem dinheiro para pagar a passagem diária de ida e volta do acompanhante de Lucas.

A saída, portanto, não leva a lugar algum, nem soluciona a dor da mãe e do seu filho que quer estudar e não tem onde.

Lucas é uma das mais de 25 mil crianças em idade escolar fora da escola no Recife.

E, ainda que ele chegue aos bancos escolares do ensino fundamental, essencial para que tenha chances, cidadania e uma vida digna, seu caminho não será fácil.

De cada 10 garotos e garotas que concluem o ensino fundamental no Recife, apenas 3 cursam o segundo grau e um acessa o ensino superior.

Sorte (?) de Lucas se não se transformar num dos 150 mil analfabetos do Recife.

E, ainda que chegue à tão sonhada escola, nosso pequeno Lucas terá pela frente o pior ensino de matemática e português em uma das piores escolas públicas das capitais brasileiras, segundo o Ministério da Educação.

Isso configura um desastre para o Recife e para todos nós.

Antes de mais nada, porque milhares de lucas, dentro e fora da escola, estão perdendo a chance de ter um lugar no futuro, dado que lhes são negados os instrumentos necessários para quebrar a barreira da pobreza que os aprisiona.

E que, não superada, quem sabe transmitida aos seus filhos e netos, os condenará a uma vida de exclusão.

Em segundo, porque, cerrada a porta da escola, muito provavelmente mais adiante lhes será a do emprego, o que os tornará, talvez, vulneráveis ao chamamento do crime e da marginalidade.

Crime e marginalidade que explodem cotidiana e insuportavelmente nas nossas ruas, escolas, trabalho e lares.

Se Lucas não tiver uma escola, dificilmente terá futuro.

Nós também não.

PS: Raul Jungmann é Deputado federal e pré-candidato a prefeito do Recife pelo PPS, escreve no Blog às terças dentro da série “Recife 2008.

Debate com os Prefeituráveis”.