Paulista à espera de obras Por Daniel Guedes, no Caderno Cidades de hoje Chega mais.
De título de telenovela e música de Rita Lee a nome de uma das comunidades mais carentes do bairro de Pau Amarelo, no município de Paulista, no Grande Recife.
O lugar, que hoje abriga cerca de 1.120 famílias, mostra que está esquecido desde sua fundação em 1985.
O grau de pobreza choca quem passa e até mesmo quem vive por lá.
Pessoas moram em meio a lama, lixo, fezes e animais.
Hoje o maior desejo de todos os moradores é uma chance para mudar de vida.
O ponto de referência para a casa da catadora de lixo Flaviana Ferreira de França, 24 anos, é uma imensa poça que se formou na rua de barro em que ela mora. “Meus meninos brincam no meio da rua, no esgoto mesmo”, diz a mãe de um menino e uma menina de 8 e 9 anos, respectivamente.
A falta de condições financeiras impede a jovem de procurar outro lugar para viver.
O rendimento diário de Flaviana é de R$ 3. “Em um dia bom dá para tirar até R$ 15.” O servente, pedreiro e picolezeiro Antônio Cícero José da Silva, 35, mora na Rua Vietnã do Norte, a principal de Chega Mais.
Asfalto ele nunca viu na comunidade.
Apenas barro define as vias.
Nos períodos de chuva forte a água chega a invadir sua casa. “Quando chove essa rua vira uma lagoa.
Não tem como passar por ela sem botar o pé na lama.
Já tive até leptospirose por ter que entrar na água suja e contaminada com xixi de rato, que tem demais aqui.
Passei dez dias na UTI e seis na recuperação”, conta Cícero que há 14 anos vive esse drama.
Poucos metros depois está a casa do servente José Fernando Leite da Silva, 37.
Há dois anos, ele divide com a esposa um imóvel de 12 metros quadrados, onde cabem um sofá, uma televisão, um colchão de casal e um fogão.
Do lado de fora há um “escondidinho” onde o casal toma banho com a água que pega na casa do vizinho.
A falta de esgotamento sanitário obriga o casal a improvisar. “Urina e água do banho escorrem para o braço de mangue aqui do lado e o resto a gente coloca num saquinho e joga no lixo.
Fica um mau cheiro horrível e dá muito maruim. É um sufoco”, conta José Fernando.
Situação pior que a dele é a da empregada doméstica Cristina Domingos da Silva, 30, que vive com o marido e um filho de 6 anos.
Para chegar até a palafita onde mora é preciso atravessar poças de esgoto e afundar os pés algumas vezes na lama até alcançar um casebre, localizado ao lado de uma criação de porcos. “A vida aqui é péssima, insuportável.
A gente não consegue nem respirar direito nesse fedor dos porcos.
Não vejo a hora de sair daqui.
Somos esquecidos nesse lugar.
Não recebo mais visita por causa desse mau cheiro”, diz a doméstica.
A família de Cristina vive em um local que um dia já foi manguezal.
Apesar de aterrado ainda é possível encontrar pequenos invertebrados escondidos e resquícios da vegetação típica.
A ocupação desregrada, o acúmulo de lixo e a conseqüente poluição resultaram no fim do emprego de muitos pescadores.
Por isso, a maior parte da população vive de bicos, esperando o dia de ver a situação melhorar.