De Veja Fino observador e implacável executor das leis que movem o poder e o dinheiro, o ex-senador Antonio Carlos Magalhães seria o primeiro a saber: quanto mais de ambos, maior a probabilidade de disputas.

Morto no ano passado, depois de uma vida em que, à exceção da Presidência da República, ocupou praticamente todos os postos que contam (inclusive os que não têm designação), ACM deixou uma herança política em refluxo e um patrimônio ainda saudável, avaliado em 345 milhões de reais, constituído por emissoras de rádio e televisão, jornal, gráfica, imóveis, ações e dinheiro.

Na semana passada, uma cena inimaginável na época áurea do leão baiano revelou a existência de uma briga feroz entre os filhos e netos pela herança do ex-senador.

Amparados por uma decisão judicial, policiais armados arrombaram o apartamento da viúva de ACM, Arlette Magalhães, de 78 anos, à procura de quadros, esculturas e objetos valiosos supostamente desaparecidos após a sua morte.

A ação foi autorizada pela Justiça depois que Tereza Magalhães Mata Pires, filha do ex-senador, acusou o irmão, ACM Júnior, de esconder dos inventariantes a parte de maior valor do acervo que o pai mantinha em casa.

A briga pela herança tem todos os elementos dos litígios familiares que entram para a história: ódios antigos, ameaças, chantagens, intrigas, espionagem e, inevitavelmente, a eclosão de segredos íntimos guardados por décadas.

Ao fundo, o panorama sempre venenoso das disputas pelo poder na Bahia.

ACM não deixou testamento.

Pela lei, seus bens devem ser divididos entre a viúva, Arlette, e os filhos, ACM Júnior e Tereza Magalhães; mais os netos Luís Eduardo Filho, Carolina Magalhães e Paula Magalhães, cujo pai, o deputado Luís Eduardo Magalhães, morreu em 1998.

A jóia da herança é a TV Bahia, emissora que transmite a programação da Rede Globo no estado.

Avaliado em 300 milhões de reais, o canal sempre foi um instrumento importante da família para conquistar e manter sua influência na região.

Alcança todos os municípios baianos e tem uma média de 70% de audiência.

Não surpreendentemente, está no centro da disputa.

Logo depois da morte do ex-senador, a filha Tereza, que é casada com o empresário Cesar Mata Pires, dono da construtora OAS, uma das maiores do país, tentou promover uma aliança estratégica com o irmão e os sobrinhos para deixar o controle da TV nas mãos do marido.

O interesse de Mata Pires pela emissora é antigo e, segundo os adversários familiares, ele tem como meta usar o canal para multiplicar seus negócios.

O empreiteiro procurou ACM Júnior, que ocupou a vaga do pai no Senado, e o deputado ACM Neto para propor um acordo.

Ofereceu a Neto uma mesada de 100 000 reais, um avião e a garantia de financiamento de todas as campanhas, “da borracha ao marketing”, para que lhe fosse passado o controle da TV.

Júnior receberia o triplo de todos os seus rendimentos provenientes da emissora.

Pai e filho recusaram a proposta, e a guerra começou.