Por Edilson Silva “É preciso cuidar das pessoas…”. “Recife precisa de rumo…”. “Que saudade da Rua do Bom Jesus…”. “Modelo colombiano de segurança pública…”.

Jogos de palavras e motes artificiais, que geralmente são cuidadosamente pensados por marqueteiros, invadem o debate eleitoral no Recife. É sempre assim nos processos eleitorais.

Um embrulho novo ou diferente para o mesmo e velho conteúdo anti-popular.

Estas são a essência e a regra das fórmulas que tentam vender os políticos tradicionais e conservadores como mercadorias numa feira chamada eleição.

Para eles a propaganda, mesmo que enganosa, é a alma do negócio.

No entanto, qual o projeto real de país e de sociedade estes candidatos e partidos têm?

A resposta é o país e a sociedade que aí estão.

Segundo eles mesmos, este é o melhor que eles podem fazer, é o máximo possível que se pode fazer.

Os que contestam esta tese, ao mesmo tempo mentirosa, covarde e apocalíptica, são chamados por eles e seus ideólogos de utopistas.

Já tentaram inclusive decretar o fim da história, mas, implacável como é, a história cisma em renovar-se sempre.

O desemprego e a miséria não são fenômenos da natureza.

A violência também não.

Os problemas ambientais, como o aquecimento global, tão pouco.

Estes fenômenos nada mais são do que o subproduto das sucessivas gestões destes senhores e seus partidos, que se revezam no poder, empurrando a sociedade de conjunto para a barbárie, sob a lógica insana, desumana e destrutiva do capitalismo selvagem.

A sociedade, portanto, precisa de um projeto estratégico distinto, e este projeto precisa necessariamente ser presidido por uma lógica igualmente distinta, que coloque em primeiro plano não a manutenção e ampliação da riqueza de uns poucos, mas a sustentabilidade da sociedade e do planeta enquanto espaço minimamente adequado para a existência digna da espécie humana, hoje visivelmente ameaçada.

Causa perplexidade, por exemplo, constatar que o mesmo telejornal que destaca o “desempenho espetacular” da indústria automobilística no país é o mesmo que noticia o caos nas grandes cidades, com engarrafamentos inacreditáveis em função da entrada diária de centenas de novos veículos nestas mesmas cidades.

Enquanto especialistas dão entrevistas na TV falando em transporte solidário (carona) para amenizar o caos, no intervalo comercial uma propaganda afirma que só não compra um carro zero quilômetro quem é bicho. É uma insanidade completa.

Mas é esta insanidade completa o horizonte estratégico dos políticos e partidos que se apresentam como alternativas para o caos criado por eles mesmos.

Esses senhores defendem o crescimento da economia capitalista como condição indispensável para resolver os graves problemas da sociedade.

A solução estratégica, para eles, passa pelo aprofundamento do caos.

Se não são desonestos, tudo indica que esperam por um milagre.

Um mínimo de honestidade intelectual basta para perceber que crescimento econômico restrito à lógica capitalista não é a mesma coisa que desenvolvimento econômico e social.

Muito pelo contrário, pode e vem significando desagregação social e agressão ao meio ambiente.

Por isso o PSOL defende um projeto nacional alternativo, encabeçado pela ex-senadora Heloisa Helena, um projeto que já conta com o apoio de parcela significativa da sociedade brasileira, e que tende a se tornar hegemônico num futuro pouco distante.

Nossas propostas para o país passam de forma incontornável por uma economia organizada sob a ótica da soberania do país e de seu povo, com controle de capitais, redução rápida da taxa de juros, reforma agrária, reforma tributária que taxe as grandes fortunas, o grande capital e os especuladores, assim como auditoria sobre a dívida pública e a conseqüente devolução aos municípios de sua maior autonomia orçamentária, permitindo-lhes serem mais sensíveis às demandas populares no âmbito das cidades.

São medidas como estas, e somente estas, que viabilizarão os recursos para atender dignamente a população com projetos estruturadores de longo prazo, como recuperar o valor das aposentadorias e pensões daqueles que recebem mais de um salário mínimo e recuperar a saúde e a educação públicas do país.

E estas medidas, os políticos e partidos que se revezam no poder, do PT ao PSDB, jamais ousarão implementar.

Seus compromissos são com a manutenção deste estado de coisas.

Dito isto, sabemos que a eleição que o PSOL enfrenta em 2008 é no âmbito dos municípios, e precisamos neste âmbito propor medidas concretas de caráter anti-capitalista e de solução ou diminuição dos problemas cotidianos do nosso povo sofrido.

Estas soluções, dentre outras, passam por medidas simples de desconcentração de renda em prol dos mais pobres da cidade, pois os grandes projetos que são anunciados como panacéia para todos os males do povo, como a Refinaria, Pólo de Poliéster, Estaleiro, etc, e que têm a sua importância sim, sempre “esquecem” dos mais pobres, que são considerados restos humanos sem serventia, e que devem esperar, moribundos, o subproduto do crescimento capitalista que nunca foi e nunca será distribuído com um mínimo de justiça.

A Prefeitura do Recife pode e deve dinamizar a economia local, gerando emprego e renda de forma não só direta, com o fortalecimento do serviço público e com a adoção de planos de obras públicas para a população, mas também de forma solidária e cooperativada.

Como?

Deixando de ser cliente * vip* de grandes empresas e priorizando comprar bens e serviços oferecidos pelo próprio povo da cidade.

Não estamos falando da canalhice de feirinhas de economia solidária e de artesanato, imersas covardemente no comércio, em que a prefeitura joga à própria sorte aqueles que tentam sobreviver num universo de desemprego estrutural.

Tomemos como exemplo o fornecimento de merenda escolar para as escolas municipais.

A prefeitura vem demitindo há alguns anos as merendeiras das escolas e creches, terceirizando gradativamente a produção e distribuição da merenda, que está sendo feita por uma única empresa, de forma concentrada.

Hoje, pouco mais de 60% das unidades escolares já recebem merenda produzida em escala industrial.

A merenda é de qualidade sofrível, e um prato de sopa custa aos cofres públicos algo em torno de R$ 3,00.

Digamos que 100 mil alunos, cerca de 2/3 do total de matriculados, façam uma refeição por dia nas escolas.

Estamos falando de um faturamento bruto de R$ 300 mil por dia, que pode chegar a R$ 450 mil/dia se a atual gestão conseguir terceirizar 100% da produção, como é a sua meta.

Por que esta merenda não pode ser produzida de forma descentralizada, nas comunidades, por cooperativas de merendeiras e serventes, por exemplo, coordenados e supervisionados pela prefeitura?

E o fardamento dos “alunos nos trinques”, não pode ser feito por cooperativas de costureiras?

Estas cooperativas, não podem também produzir o fardamento da Guarda Municipal e demais setores que precisam destes serviços?

O recolhimento e tratamento do lixo, cheio de atravessadores e empresas terceirizadas, cheio de indicação de vereadores, também não pode ser feito com a participação direta das comunidades, num sistema também cooperativado?

E a medicina popular, que avança como forma científica alternativa de tratamento de saúde em contraposição à mercantilização imposta pelos grandes laboratórios farmacêuticos, não poderia ser desenvolvida nas comunidades, numa articulação entre escolas e postos de saúde da prefeitura?

Estas medidas podem parecer pequenas diante do anúncio de obras faraônicas, como os políticos das elites gostam de fazer, mas farão muita diferença às populações sofridas das comunidades carentes de nossa cidade.

A desconcentração de renda e dinamização econômica e política local exigirão mais recursos da prefeitura? É bastante provável que sim, mas os governos não investem tanto em bolsa-escola, bolsa-família, bolsa-aluguel, deixando milhões de famílias reféns dos governos de plantão?

Por que então não investir em iniciativas de dinamização da economia popular, de auto-sustentabilidade e dignidade das pessoas?

Sim, outra cidade é possível.

PS: Silva é presidente do PSOL/PE, é pré-candidato a prefeito do Recife e escreve no Blog todas as sextas dentro do projeto de debate sobre o Recife 2008.