Fábrica de ilusões Por Jayme Asfora João Victor Portelinha de Oliveira tem apenas oito anos, cursa o quarto ano do ensino fundamental em Goiânia (GO) e já tem uma história marcante que vai lhe acompanhar pelo resto de sua vida: foi aprovado no vestibular para o curso de Direito da Universidade Paulista (Unip).
Gênio ou Sortudo?
Seja qual for a resposta, o caso de João Victor ganha contornos emblemáticos se levarmos em consideração a realidade do ensino superior no País e, em especial, o jurídico.
Por mais inteligente que o garoto goiano seja, considero que, até hoje, ele não teve contato pleno com temas que deveriam constar de uma prova de vestibular.
O ensino fundamental e médio no Brasil segue um único conteúdo programático, ainda precário, em qualquer cidade ou Estado, do Oiapoque ao Chuí, nas escolas públicas ou particulares.
Portanto, mesmo com o amplo acesso à informação - privilégio das gerações pós-internet -, João Victor não teve a formação completa que deveria ser necessária a quem presta esse tipo de exame.
Por outro lado, temos em vigor, no Brasil de hoje, um mercantilismo exacerbado do ensino superior em contraponto com o inchaço do mercado em algumas profissões.
No universo jurídico, se não bastasse o fato de o País já contar com quase 25% de todos os advogados do mundo (dados do Conselho Federal da OAB), anualmente milhares de jovens desembarcam dessas “fábricas de ilusões” oriundos, algumas vezes, de instituições que, sequer, foram criteriosas na hora de aceitá-los como seus alunos. É por isso que a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) cobra, sistematicamente, um maior rigor por parte do Ministério da Educação na hora de autorizar o funcionamento das instituições de ensino superior. É FUNDAMENTAL que os pareceres sobre novos cursos emitidos pelo nosso Conselho Federal e pelas OABs estaduais sejam vinculativos e não recebidos como mera opinião.
Entre 2001 e 2003, dos 222 cursos de Direito autorizados pelo MEC a funcionar, apenas 18 obtiveram parecer favorável da Ordem.
Ou seja, todo o restante foi considerado inapto ao ensino do Direito.
DEVE-SE CUMPRIR À RISCA a Portaria nº 147 de 02 de fevereiro de 2007, do ministro da Educação Fernando Hadad, determinando que, em caso de um parecer negativo da Ordem, o processo seja submetido a uma instância recursal.
Além disso, cabe ao MEC também analisar criteriosamente o processo de ingresso dos estudantes a estas instituições, seja por vestibular tradicional, seja por outro mecanismo.
Queremos, assim, garantir aos futuros bacharéis - que dedicam recursos humanos e financeiros à sua formação superior - um ensino de qualidade que os capacite para enfrentar o mercado.
De nossa parte, continuamos a defender intransigentemente a realização do Exame de Ordem como principal filtro social, permitindo que a sociedade tenha acesso, sempre, a profissionais de fato competentes.
Pernambuco hoje conta com 28 faculdades de Direito.
Já chegamos, no ano passado, a ficar entre os quatro Estados com o melhor desempenho no Exame Unificado - aplicado em 24 das 27 seccionais da OAB do País.
No último Exame, a Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) obteve a quinta colocação de todo o País em número de alunos aprovados, com um índice de 87,21% - sendo a única a obter, no Estado, um percentual superior a 60%.
Não que o Exame deva servir para impedir o aumento da concorrência, mas queremos sim que, ao entregarmos cada nova carteira de advogado, isso seja feito a um cidadão consciente dos seus deveres previstos no Estatuto da Advocacia e da OAB (LEI FEDERAL Nº 8.906/94) como os de “lutar sem receio pelo primado da Justiça; de pugnar pelo cumprimento da Constituição e pelo respeito à Lei” e de “proceder com lealdade e boa-fé em suas relações profissionais e em todos os atos do seu ofício”. É nosso dever impedir que pessoas sejam lesadas - seja financeiramente ou moralmente por maus profissionais, quando a própria Constituição Federal, em seu artigo 133, determina que o advogado é indispensável à administração da Justiça.
E, como bem disse o nosso presidente nacional, Cezar Britto, “a advocacia é o porto seguro da cidadania”.
PS: Jayme Asfora é presidente da OAB-PE e escreve regularmente no Blog de Jamildo.