Documentos a que o Blog teve acesso sobre uma dispensa de licitação tentada pela Secretaria de Desenvolvimento Urbano em 2002, ainda no governo Jarbas Vasconcelos, mostram uma estranha relação entre a Fundação de Apoio ao Desenvolvimento da UFPE (Fade) e a Datamétrica, empresa do economista Alexandre Rands.
A Fade está sendo investigada pela CPI das ONGs no Senado e pelo Ministério Público de Pernambuco por se beneficiar de contratos com dispensa de licitação - prerrogativa de fundações ligadas a universidades.
A Datamétrica é apontada como sua parceira em algumas ocasiões.
No caso específico da Secretaria de Desenvolvimento, tentou-se contratar a Fade, com dispensa de licitação, para realizar um “estudo dos impactos sócio-econômicos da Transnordestina em Pernambuco”.
Valor do serviço à época: R$ 800 mil.
O então superintendente do Programa de Estadual de Projetos Especiais (Projesp), da secretaria de Desenvolvimento Urbano do estado, Saulo Freire, autorizou a contratação da Fade, com dispensa de licitação, em 18 de abril de 2002.
No dia 30 daquele mês, o então secretário Evandro José Moreira de Alencar, enviou ofício à Procuradoria Geral do Estado solicitando parecer favorável à contratação.
A procuradoria respondeu recomendando, entre outras ações, que a secretaria fizesse um orçamento com instituições semelhantes à Fade para que se pudesse comparar preços.
Foi aí que apereceram as ligações suspeitas entre a fundação e a Datamétrica.
REPRESENTANTE COMUM A mesma pessoa que havia encaminhado à Secretaria de Desenvolvimento Urbano toda a documentação relativa à Fade, a consultora de projetos Analice Amazonas, apareceu também como a responsável pelo proposta técnica da Datamétrica, indentificando-se como diretora da empresa.
Até o telefone de contato fornecido por ela à secretraia era o mesmo nos dois casos.
A proposta de preço apresentada por Analice Amazonas pela Datamétrica chegou a R$ 855.760,00 - contra os R$ 800 mil propostos pela Fade.
Uma terceira empresa, TJV, propôs R$ 950 mil para realizar o serviço.
A fade venceu, mas não levou.
A história foi parar no Tribunal de Contas do Estado (TCE), a partir de uma denúncia formalizada pelo Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia de Pernambuco (Crea) e Associação Brasileira de Consultores de Engenharia (ABCE).
Segundo a conselheira Teresa Duere, relatora do processo na primeira Câmara do TCE, houve no episódio aplicação indevida do artigo 24, inciso XIII, da Lei de Licitações (no. 866/ 93) “com a finalidade específica de burlar” a legislação.
Pelo artigo, para justificar a dispensa de licitação na contratação da Fade seria necessário que o objeto do contrato se relacionasse a atividades de pesquisa, ensino ou desenvolvimento institucional.
O que não era o caso no entendimento do TCE.
Além do fato de se ter uma única pessoa como representante de duas empresas (a consultora Analice Amazonas), a conselheira Teresa Duere também destacou, em seu voto, que a Fade se preparava para terceirizar os serviços que se propunha fazer - procedimento ilegal, em se tratando de contratos com dispensa de licitação.
Segundo o voto de Teresa Duere, chamavam atenção, na proposta da Fade, custos com aplicação de 7.000 questionários em duas etapas. “Ora, a Fade não possui pessoal para aplicação destes questionários.
Estes são serviços que certamente serão terceirizados.
Ademais, estes itens representam 34% do total do projeto”, diz trecho do voto de Teresa Duere. “Assim, sendo, conclui-se que o pagamento de 50% já nos primeiros 30 dias irão subsidiar a subcontrataçãode terceiros, configurando-se, tal fato, desrespeito às disposições contidas na Lei de Licitações”, afirma.
UNANIMIDADE Como o objeto do processo no 0204251-4, no TCE, era a dispensa de licitação irregular por parte da secretaria de Desenvolvimento Urbano, o tribunal não se aprofundou no caso para averiguar que empresa ou empresas se beneficiariam pela terceirização dos serviços da Fade.
A relação com a Datamétrica, por exemplo, foi apenas levantada, sem que outras investigações fossem feitas.
Teresa Duere julgou irregular a dispensa, recomendando que a contratação da Fade fosse anulada.
Como o serviço não havia sido realizado - e portanto, a secretaria não havia feito qualquer desembolso ainda - o TCE não não precisou determinar a devolução de recursos aos cofres públicos.
Nenhum dirigente da secretaria ou da Fade foi multado.
O relatório de Teresa Duere foi aprovado por unanimidade de quatro votos na primeira câmara do TCE.
A secretaria de Desenvolvimento Urbano não recorreu da decisão.