Do Comunique-se Se estivesse vivo, certamente o jornalista norte-americano Herbert L.

Matthews teria muita história para contar nesta quarta-feira (20/02), data da repercussão mundial da renúncia de Fidel Castro.

Editorialista do jornal The New York Times no período pré-revolução, Matthews fez uma entrevista que entraria para a história: desbravou Sierra Maestra, região montanhosa ao sul de Cuba, para se encontrar com um “jovem rebelde”, Fidel Castro.

Com sua série de reportagens favoráveis a Castro e contra o então ditador cubano Fulgêncio Batista, o governo norte-americano se tranqüilizou – e deu-se a revolução.

O que não se previa era que Fidel comandasse, por 49 anos, uma nação de total resistência ao american way of life. “Matthews contribuiu muito para que não houvesse represália à guerrilha”, analisa o jornalista Fernando Morais.

Primeiro repórter brasileiro a entrevistar Fidel no poder, o escritor brasileiro enumera os motivos da “ajuda significativa” de Matthews: o jornalista norte-americano tinha credibilidade por ser de “mais de direita que de esquerda” e tinha reputação garantida. “A cobertura de Matthews mostra o papel que o jornalismo pode ter no curso da história”, afirma.

A entrevista do jornalista do Times com Fidel rendeu uma série de reportagens.

A primeira delas, “Rebelde cubano é visitado em esconderijo; Castro está ainda vivo e luta nas montanhas”, edição de domingo de 24 de fevereiro de 1957.

O lead: “Fidel Castro, o líder rebelde da juventude cubana, está vivo e lutando duro e com sucesso nas montanhas da quase impenetrável e distante Sierra Maestra, ao sul da ilha.” Nas matérias, dizia: “Castro tem idéias fortes de liberdade, democracia, justiça social e a necessidade restaurar o Constituição.” Meses antes, o próprio Times afirmava que Fidel havia morrido, numa tentativa de levante contra Batista no Golfo do México e com a ajuda de um iate norte-americano.

A notícia, contudo, vinha do próprio governo de Fulgêncio Batista.

Para Fidel, a entrevista com o norte-americano fazia sentido: era hora de mostrar que a revolução continuava.

A história do encontro está descrita no livro do jornalista do Times Anthony DePalma, a ser lançado em breve no Brasil.

O jornalista Fernando Morais foi o primeiro brasileiro a se encontrar com o presidente cubano depois da revolução. “Estava em Lisboa, na Revolução dos Cravos, quando a embaixada de Cuba disse: ‘a embaixada quer falar com você’.” Dava-se aí, depois de quatro anos, a concessão para um visto ao brasileiro.

Mesmo com a inscrição do passaporte brasileiro excluindo-se da responsabilidade de ir a Cuba - “não é válido para Cuba” -, dizia o passaporte, Morais não se abalou: “Apesar disso, fui.” Ficou três meses e escreveu “A Ilha”.

Vendeu 700 mil cópias. “Sucesso menos por virtude minha e mais porque a imprensa só falava mal do regime.

Na hora que saiu um trabalho isento, todo mundo quis ler”, argumenta Morais. “Não há perigo nenhum que Cuba se renda ao capitalismo”, diz Morais.

O escritor argumenta que as realidades de países que adotaram recentemente o capitalismo, como a China, são completamente diferentes da de Cuba, o que impossibilita qualquer comparação.

Morais não esconde a simpatia por Cuba.

Mas adverte: “Não tenho uma visão romântica.” Tem fuzilamento? “Tem”, admite.

O jornalista, contudo, contrapõe a repressão. “Coloca aí”, afirma à reportagem do Comunique-se, “tenho solidariedade a Cuba por uma simples razão: quando descemos no aeroporto, encontramos uma placa colocada na ocasião da visita do Papa ao país, em 1999: ‘Esta noite 200 milhões de crianças vão dormir na rua.

Nenhuma delas é cubana’.

E é verdade.

Já morei nos Estados Unidos, na França e no Japão.

Todos eles têm famílias e famílias em baixo dos viadutos.

Em Cuba, não.” Cuba sem Fidel Morais com Fidel Matthews com Fidel