Desesperado para a derrota que veio a sofrer na votação da CPMF, o governo federal protagoniza um espetáculo tragicômico de recuos, contradições e desconcertos desde que, há exatamente um mês, viu-se confrontado com a perda dos R$ 40 bilhões provenientes do chamado imposto do cheque.
Primeiro ato: o presidente Lula entra em cena para declarar que não se cogitava de nenhum pacote para compensar a queda na arrecadação.
Logo em seguida veio o pacote, na forma de um aumento emergencial nas alíquotas do IOF e da contribuição sobre o lucro dos bancos.
A credibilidade presidencial só não sofreu um duro golpe porque, na verdade, a opinião pública já se habituou a conceder a Lula a indulgência reservada aos que falam em demasia, não têm idéia precisa do que estão dizendo e não se importam em desdizer o que já disseram.
Surge em seguida o ministro Guido Mantega.
Confrontado com a promessa de que não haveria aumento de impostos para recuperar as perdas da CPMF, saiu-se com o argumento de que o prometido valia para o ano de 2007, mas não para uma ou duas semanas depois.
A tirada, de um desplante raro até mesmo para os padrões vigentes em Brasília, despertou alguma reação coreográfica entre os oposicionistas -que tampouco puderam convencer o público no papel de vítimas de uma traição inesperada.
Entrou-se então na fase de discutir os cortes no Orçamento.
Os investimentos do PAC não seriam atingidos, sinalizava o Planalto -mas o líder do governo no Senado, Romero Jucá, julgou necessário desmentir a disposição, depois de reunir-se com os ministros José Múcio, das Relações Institucionais, e do Planejamento, Paulo Bernardo.
Haverá então cortes nas emendas parlamentares ao Orçamento.
Não, muito pelo contrário: nada mais difícil do que fazer isso em ano eleitoral.
Já o superávit primário será mantido.
Será mesmo?
O presidente Lula dera garantias quanto a esse ponto, em dezembro.
O ministro Paulo Bernardo foi menos taxativo, na segunda-feira passada.
Faltava ainda um toque para cristalizar a impressão de que uma peça de teatro mambembe é encenada pela equipe do Planalto.
Noticia-se que a base governista no Congresso pensa, agora, em recriar a CPMF.
A proposta é tão disparatada que o próprio Executivo por ela não se responsabiliza -mas fica evidente o quanto a manobra visa, de modo tosco, a aumentar seu cacife nas negociações.
O vexaminoso espetáculo da irresponsabilidade, da falta de rumos, do desmentido e da bravata não tem hora marcada para terminar.
Interrompe-o, brevemente, um anúncio especial para a platéia.
O novo ministro de Minas e Energia é Edison Lobão.
Seria o bastante para o público pedir seu dinheiro de volta. “Que dinheiro?”, perguntam em coro as autoridades, antes de prosseguir na farsa.
Editorial da Folha de São Paulo hoje