Por Edílson Silva Ontem, 10 de janeiro, um manifesto assinado por várias entidades, movimentos sociais, religiosos, intelectuais e outras personalidades foi divulgado em nível nacional.
O manifesto defende em seu título uma campanha por uma reforma tributária justa, mas seu conteúdo não consegue disfarçar sua estratégia de defesa do governo Lula.
O manifesto é, antes de tudo, contraditório.
Não poderia deixar de ser, a começar pelos nomes que o subscrevem.
Gente da cúpula da CUT, PC do B, UBES, UNE, MST, da ala progressista da Igreja Católica, como o Dom Tomás Balduíno, da monolítica Igreja Universal dos Bispos Macedo e Crivella, e até gente do PSOL, como o Plínio de Arruda Sampaio, que subscreve como presidente da Associação Brasileira de Reforma Agrária.
O conteúdo do manifesto possui dois pontos que poderiam ser subscritos por qualquer membro da mais coerente ala da esquerda brasileira: “*O Brasil precisa de uma verdadeira reforma tributária, que torne mais eficaz o sistema de tributação.
Hoje 70% dos impostos são cobrados sobre o consumo e apenas 30% sobre o patrimônio. É preciso diminuir o peso sobre a população e aumentar sobre a riqueza e renda.
Reduzir a taxa de juros básica paga pelo governo aos bancos e as escandalosas taxas de juros cobradas aos consumidores e empresas.
Eliminar as taxas de serviços pelas quais os bancos recolhem por ano R$ 54 bilhões!(…)*” “*O Brasil precisa de uma política permanente de distribuição de renda.
Para isso, será necessário tomar medidas que afetem o patrimônio, a renda e os privilégios da minoria mais rica.
Precisamos aumentar as oportunidades de emprego, educação e renda para a maioria da população.
Usar os recursos dos orçamentos da União e dos estados, prioritariamente, para ampliar os serviços públicos, de forma eficiente e gratuita para toda população, em especial saúde, seguridade social e educação.*” Talvez estas reivindicações tenham atraído para o manifesto setores honestos e coerentes da esquerda brasileira, mas tudo indica, e quero crer, que estes setores não se aperceberam do conjunto do conteúdo do manifesto e do momento em que ele é divulgado.
Assim, emprestaram seu prestígio e autoridade moral, política e intelectual a uma manifestação de apoio a um governo que já se mostrou serviçal das elites mais graúdas.
O manifesto parte da premissa que a CPMF era um bom imposto, ou no mínimo necessário, e que a oposição de direita no Senado, somente ela, articulou-se com as elites mais retrógradas para acabar esta fonte de arrecadação do governo federal.
Com estas premissas, o manifesto parte do pressuposto de que a realidade tributária construída por cinco anos de farra da agiotagem no governo Lula era inevitável, ou no mínimo necessária.
Com estas premissas, não há espaço para um questionamento à esquerda sobre a CPMF e sobre o pacotinho anunciado pelo governo no último dia 2 de janeiro, ou seja, quem não está com o governo faz parte da direita mor deste país.
O PSOL votou contra a CPMF na Câmara e no Senado, e estará junto com os servidores e a sociedade contra o pacote que penaliza os servidores e o conjunto da sociedade.
Apesar dos serviçais das elites buscarem distorcer conceitos e categorias políticas, colocando inclusive grandes empresários do PTB e PR em “frentes de esquerda”, são de esquerda somente aqueles que na luta política estão ao lado do povo por seus direitos e reivindicações, lócus onde o PSOL se encontra.
A luta que se trava agora entre DEM e PSDB contra o governo Lula é uma contenda das elites.
Os ricos estão brigando para saber quanto vão continuar ganhando.
Ao povo e aos servidores resta saber quanto e como vão perder.
O governo Lula já anunciou que pelo menos 50% dos R$ 40 bilhões perdidos da CPMF serão pagos diretamente pelos servidores e por programas que atenderiam às populações mais necessitadas do país.
Neste momento, vários setores do funcionalismo federal estão em estado de alerta e de mobilização para evitar que os de baixo paguem a conta.
Os servidores sabem que a luta será para dobrar o governo.
No entanto, o manifesto pela reforma tributária justa afirma que quem quer cortar gastos públicos a arrochar ainda mais o funcionalismo é a “direita”: “Defendemos que o corte de gastos públicos, exigido pela direita, seja feito no superávit primário (…)”.
Assim, o manifesto gera confusão no povo, livrando as responsabilidades do governo Lula com as medidas que ele já anunciou, de limar os servidores e programas sociais, sem combinar com a “direita”.
A impressão que dá é que diante da possibilidade do governo Lula ficar imprensado entre a oposição oportunista e eleitoreira de direita, do DEM/PSDB, e fortes manifestações de servidores públicos, exatamente num ano eleitoral, a “cavalaria” veio ao auxílio do governo.
Da CUT, UNE, UBES, PC do B e alguns outros, não se esperava outra coisa, pois fazem parte da base governista e estão bem acomodados em polpudos cargos.
Outros setores, lamentavelmente, mostram-se ainda iludidos com a tese de que o governo Lula está em disputa.
Será ingenuidade?
O PSOL também quer reforma tributária justa, e se unirá com todos os honestos segmentos da sociedade que queiram discutir, propor e lutar por medidas progressivas neste terreno.
Porém, não nos iludamos.
O governo Lula já vai para seu sexto ano consecutivo e a concentração de renda no Brasil não faz inflexões estruturantes para outra direção, pelo contrário.
Só haverá reforma tributária justa no Brasil derrotando o governo Lula e suas políticas subservientes ao grande capital, e buscando-se construir uma institucionalidade que garanta de fato e de direito o exercício da justiça social.
PS: Edilson Silva é membro da Direção Executiva Nacional do PSOL e Presidente do PSOL/PE, escreve às sextas para o Blog de Jamildo