Editorial do JC de hoje Era previsível que haveria uma reação do governo diante da rejeição do Senado à CPMF.
Apesar de um ato político dentro de um regime republicano e democrático, a decisão dos senadores prenunciava algum tipo de retaliação, pelos seguidos pronunciamentos dos mais altos postos do Executivo.
O que está brotando em Brasília, entretanto, vai muito além do que as mais pessimistas mentes poderiam imaginar.
Para arrecadar os R$ 40 bilhões de contribuições – nascidas provisórias mas com vocação de permanentes – que o Senado rejeitou em um processo aberto, identificando-se cada um dos parlamentares que disseram sim, ou não, o governo lança mãos do que há de mais condenável, aumentando tributos em um País onde notoriamente se instalou um furor tributário que compromete a produção e onera o bolso de todos.
O discurso oficial pode até ser ao contrário, justificando o furor tributário com a necessidade de atendimento aos programas sociais.
Igualmente se pode argumentar que o governo está certo, na medida em que tem a aprovação popular, aferida em todos os órgãos de consulta da opinião pública.
Da mesma forma, porém, pode-se afirmar que o sucesso do momento não exclui a responsabilidade pelo futuro. É na idéia da responsabilidade pelo futuro que se tem a dimensão do estadista, jamais daquele que trabalha apenas de olho na próxima eleição.
E essa responsabilidade tem hoje uma conotação bem mais profunda que o atendimento emergencial dos excluídos: e deve abrigar a idéia de que se trabalha para não haver mais excluídos e isso implica em condições permanentes de crescimento e redistribuição material.
Um componente que não pode excluir o outro.
Aumentar tributos não é, certamente, o melhor caminho para a construção desse Estado ideal.
Desonerar a produção sempre foi, e continua sendo, o discurso de todos que querem chegar ao cume do poder.
Assim como foi, e continua sendo, apenas uma expressão retórica, para a qual sempre haverá uma justificativa, às vezes até exageradamente popular, como a da “metamorfose ambulante”.
O pernambucano Luiz Inácio Lula da Silva é inteligente demais para entender que não governa apenas para as atuais gerações e a ele devem chegar os aconselhamentos de quem quer vê-lo sempre bem festejado pelas massas, mas quer também que o Brasil seja festejado como uma nação onde o governo arrecada o suficiente para atender às exigências sociais.
E isso pode ser feito sem que se gere a desconfiança entre o público e o privado, mas, pelo contrário, em um trabalho permanente de parceria.
Onerar ainda mais o bolso do brasileiro para tirar os recursos que seriam gerados pela CPMF é uma atitude pouco racional e muito menos generosa para com um povo que entra em um estádio de crença e otimismo, como se vê hoje por toda parte.
No mínimo o governo conseguirá, com esta atitude, reproduzir o mesmo confronto que provocou no Senado com a votação e rejeição daquele tributo.
Ferida em seus brios, até mesmo porque não tem nada a perder – desde que a perda já está exposta nos extraordinários índices de popularidade do presidente – a oposição pode atrapalhar o ritmo da administração, o que a ninguém nunca deve interessar.
O Brasil caminha bem, mesmo submetido a um sistema tributário que, de tão irracional, está sempre na pauta de reforma.
Criar dificuldades neste momento, seria atropelar uma caminhada que só pode trazer benefícios, em especial para milhões que nunca tiveram governo, porque continuam excluídos dos direitos – e deveres – mais elementares da cidadania.