Por Edílson Silva* 20 de novembro é o Dia Nacional da Consciência Negra, data que marca a imortalidade de Zumbi dos Palmares, líder maior e herói da resistência quilombola no Brasil.

Zumbi tombou em combate em 20 de novembro de 1695, após praticamente 100 anos de resistência do Quilombo dos Palmares.

A luta de Zumbi é parte destacada da luta do povo negro na diáspora.

A chegada dos primeiros navios negreiros no Brasil marcou também a chegada da forte resistência contra a escravidão.

Até hoje, a história do povo negro no Brasil tem sido de luta contra a discriminação racial em suas várias faces.

Esta luta só não foi maior que a contribuição deste povo no crescimento e desenvolvimento do Brasil em suas várias fases.

Apesar dos avanços obtidos nestes séculos de luta, como a liberdade e a criminalização da prática de racismo, o povo negro segue sendo discriminado e principal vítima das desigualdades sociais, que têm no Brasil um forte componente racial.

As mazelas do capitalismo são sempre mais dramáticas para o povo negro.

O desemprego é maior e mais irreversível entre os negros.

Quando empregados, os negros recebem salários menores que os não-negros.

Entre as mulheres, que já são discriminadas no mercado de trabalho em relação aos homens, os menores salários são das negras.

Entre os estudantes universitários, os negros são uma pequeníssima minoria.

Entre os favelados do país, a maioria é negra.

Entre as vítimas da violência policial, a esmagadora maioria são jovens pobres e negros.

Neste quadro, não é difícil perceber que os jovens pobres das periferias são vítimas em potencial do aliciamento para o crime, e que a maioria da população carcerária no Brasil seja formada por estas vítimas.

Um ciclo de opressão, exclusão, repressão e criminalização.

Assim como outros movimentos sociais no Brasil, o movimento negro organizado, pelo menos nos últimos 25 anos, também depositou esperanças num governo de esquerda, encabeçado por Lula e formado pelo PT e seus partidos aliados.

Apostaram na construção de um projeto alternativo de governo e de poder que pudesse iniciar um processo de reversão deste ciclo vicioso.

Infelizmente, o povo negro também foi traído.

Lula, o PT e o PC do B, assim como fizeram com o movimento sindical, estudantil, feminista, ambientalista, dentre outros, também cooptaram lideranças do movimento negro, dando-lhes alguns cargos no governo federal, em governos estaduais e prefeituras, em gabinetes parlamentares, e conseguiram assim dividir a resistência popular também neste terreno.

Pernambuco é um grande exemplo desta triste situação.

Muitas “lideranças do povo negro” mudaram de vida com a chegada da “esquerda” ao poder, enquanto a realidade da maioria da população não apenas não se alterou para melhor, como vem piorando.

O máximo que estes governos ditos de esquerda têm feito é apresentar programas pífios de promoção de igualdade racial, em que os grandes beneficiados são geralmente os “coordenadores dos projetos”, sobrando para as populações afro-descendentes medidas assistencialistas superficiais, e cujos recursos somados são inferiores aos gastos destes governos com suas propagandas institucionais.

Gastam mais recursos para dizer o que supostamente estão fazendo do que com o que efetivamente deveria ser feito.

Dados publicados pela Anistia Internacional e pela Justiça Global, organizações que lutam pela defesa dos Direitos Humanos, mostram que entre 1995 e 2003 a população carcerária no Brasil cresceu 95%, enquanto a média mundial no mesmo período ficou entre 20% e 30%.

A recente rebelião no presídio Aníbal Bruno, em Recife, coloca esta realidade de forma nua e crua.

Este período, 1995 a 2003, coincide com os anos dos primeiros balanços da aplicação do neoliberalismo no Brasil, em que o Estado foi se apequenando no atendimento às demandas populares, afastando-se de suas poucas características de bem-estar social, e se agigantando no financiamento da burguesia financeira e na repressão ao povo sem alternativa.

De 2003 para cá os superávits fiscais vêm se ampliando e a manutenção da agiotagem oficial é garantida com zelo por Lula e sua equipe econômica.

Ou seja, o drama dos pobres se aprofunda estruturalmente, a violência também, e o crescimento da população carcerária, formada majoritariamente por negros, conseqüência da irresponsabilidade dos governos capitalistas que se sucedem, continua crescendo a taxas desesperadoras.

O governador do Rio de Janeiro, Sergio Cabral, já apresentou sua alternativa: legalizar o aborto, para fechar a “fábrica de marginais” nas favelas.

Outros menos corajosos reivindicam mais recursos federais para a construção de mais presídios de segurança máxima.

Uma outra parte defende a proliferação de clones do Capitão Nascimento.

Um sentimento fascista, com o aprofundamento do racismo, vai se fortalecendo gradativamente na consciência das elites, que vai por sua vez “escapando” para a consciência social.

Como o capitalismo vigente a cada dia tira mais e mais seres humanos do universo da produção e do consumo, a alternativa que seus porta-vozes apresentam é a criminalização da pobreza, para justificar seu extermínio e seu encaixotamento em presídios.

Tudo para manter intactas as engrenagens da decadente e parasitária burguesia financeira.

Esta política, como já colocado, atinge, antes de tudo, a população negra.

A luta dos negros no Brasil é, portanto, a luta por uma sociedade mais humana e racional.

Não há solução possível para o povo negro nos limites da predominância desta lógica das elites, que coloca interesses econômicos de grupos privados acima da vida, da civilização, da natureza.

A luta do povo negro deve ser pela redução da jornada de trabalho, para ampliar a utilização de mão de obra no mundo do trabalho; deve reivindicar um agressivo projeto de construção e regularização de moradias populares, de urbanização de favelas; deve reivindicar uma rigorosa reforma agrária; deve reivindicar o desmonte da atual estrutura das polícias, culturalmente racistas, desmilitarizando-as e substituindo-as por estruturas democráticas, que sejam responsáveis perante toda a sociedade; deve exigir educação de qualidade, cultura, esporte e lazer para a juventude brasileira.

Os recursos públicos para encaminhar estas medidas estão hoje, como há décadas, sendo carreados para a agiotagem do sistema financeiro, e é lá que devem ser buscados.

Sem estas medidas, o sistema de cotas nas universidades públicas, assim como outras medidas de ação afirmativa, que são medidas corretas encampadas por amplos setores do movimento negro brasileiro, não passarão de meros penduricalhos mergulhados na mesma lógica capitalista que oprime, exclui, reprime e criminaliza os pobres e negros. *Presidente do PSOL/PE, escreve às sextas para o Blog.