Do UOL Quando “Tropa de Elite” tornou-se na sexta-feira o filme brasileiro mais visto nos cinemas neste ano, José Padilha livrou-se da sensação de flamenguista duplamente injustiçado. “Todo mundo sabia que o Flamengo foi pentacampeão.

Mas, como um dos campeonatos não foi reconhecido [o de 1987], agora dizem que o São Paulo é pentacampeão.

Todo mundo sabia que “Tropa de Elite” teve muito público.

A confirmação de que ele foi o mais visto do ano torna isso oficial”, afirma o diretor de “Tropa…”.

Embora o longa lidere o ranking de bilheteria nacional (ultrapassou “A Grande Família” com a bilheteria da última sexta e chegou a 2,10 milhões de espectadores com os resultados de anteontem), é ainda considerado uma derrota, no “tapetão”, para a pirataria, de acordo com a avaliação do distribuidor Jorge Peregrino, do estúdio Paramount, que fez o lançamento comercial.

A estréia do filme estava originalmente prevista para este mês.

Foi antecipada para setembro passado, depois que uma versão preliminar do título foi desviada para o mercado pirata de DVDs, onde se tornou febre de consumo.

Por causa do consumo ilegal, Peregrino estima haver deixado de vender “no mínimo, entre 1,5 milhão e 2 milhões” de ingressos nos cinemas.

A base de comparação do distribuidor é o desempenho de “Carandiru”, de Hector Babenco, que reconstitui o massacre de 111 detentos no famoso presídio paulistano, ocorrido em 1992, e foi visto por 4,6 milhões de espectadores em 2003. “Não tenho nada de científico [como argumento]”, diz Peregrino. “Mas o feeling que a gente tem e a velocidade de queda [do público nos cinemas] no Rio de Janeiro indica que o impacto da pirataria foi monstruosamente alto”, conclui. “Tropa de Elite” não chegará a mais de 2,5 milhões de espectadores no cinema, segundo as estimativas da Paramount.

Baixa renda O distribuidor que lançou “Carandiru” e “2 Filhos de Francisco” (5,4 milhões de espectadores) nos cinemas, Rodrigo Saturnino, da Columbia, corrobora a análise de que “Tropa de Elite” teve seu desempenho nos cinemas bastante prejudicado pela pirataria. “Observando o resultado de cada sala em que o filme está em cartaz, nota-se que as áreas de população de baixa renda não reagiram para esse filme como reagiram a “Carandiru” e “2 Filhos de Francisco", diz Saturnino.

Isso indica, na opinião do distribuidor, que “o consumidor de baixa renda que comprou o DVD pirata não foi ver o filme de novo no cinema, como pode ter ocorrido com parte do público da classe média”.

Padilha se incomoda especialmente com o fato de que seu filme, orçado em R$ 10,5 milhões, tenha vazado para a pirataria antes de estar concluído. “A pirataria foi muito ruim, porque expôs a uma quantidade enorme de gente meu trabalho inacabado”, diz ele.

Sem meios para mensurar com rigor o impacto da pirataria em “Tropa de Elite”, Peregrino diz que “nunca saberemos o tamanho do dano”, mas afirma lamentar sobretudo “que essa questão esteja sendo encarada com a mesma leniência com que se encara muito mais coisa no Brasil”.

Debate Já o diretor-executivo da Associação Antipirataria Cinema e Música, Antonio Borges Filho, vê como positivo o debate em torno do tema suscitado pelo filme. “Todo debate traz frutos, senão a curto prazo, pelo menos a médio prazo”, diz.

O cineasta Fernando Meirelles depreende do alcance popular de “Tropa de Elite” outro bom sinal: “Há uma tendência a achar que o cinema brasileiro teve um espasmo de aceitação de público há uns anos [em 2003, 21% do total de público no país foi para filmes nacionais], mas que seu lugar seria voltar a ocupar uns 10% do mercado.

Esse filme provou que não é assim”.

O diretor de “Cidade de Deus” avalia “Tropa de Elite” como o maior fenômeno recente “em termos de comunicação e diálogo com o país”.

Meirelles diz que, “nem a Globo, com sua média de 35% de audiência diária conseguiu, em toda a sua história, tal participação na vida nacional”.