Por Luís Carlos Lins, do Fórum Pela Ética na Política Adolescentes, que gostam de olhar o mapa do mundo ou de navegar na rede, talvez já tenham visto Tuvalu, um arquipélago da Oceania.

Pois este país vendeu sua terminação na Internet (que é .tv) para uma companhia da Califórnia.

Valor: 300 mil dólares. É claro que, se a desinência fosse .tuou . tl, duas possibilidades bem razoáveis, não valeria grande coisa. (Outro micro-país, Nauru, vendeu algumas terminações para agências de notícias.

Em inglês, nu se pronuncia como new, novidade – o que é menos interessante, claro, do que seu significado em português.

Mas já rende um dinheirinho).

O pequeno país, que só tem dez mil habitantes, agora pode pagar a filiação às Nações Unidas.

Para Tuvalu é essencial participar dos foros internacionais, porque está tão perto do nível do mar que o efeito-estufa poderá acabar com sua existência física nas próximas décadas.

O episódio é significativo.

Um país está a ponto de sumir do mapa.

Para sobreviver, vende seu domínio na Internet.

Sorte sua, que tenha esse trunfo.

Mas o que isso nos ensina sobre as relações entre poder e TV?

Um Estado nacional, embora mínimo, vale menos que um endereço na Internet.

Mais um sacrifício do Estado nacional à mídia!

Faz tempo, estive em São Marinho, pequena república incrustada na Itália.

Li quais eram as principais receitas do micro-país (há uma associação européia dos micro-países, incluindo Andorra, Mônaco, Liechtenstein e talvez o Vaticano).

A primeira era o turismo.

Mas duas outras eram curiosas.

Uma era a venda de selos para filatelistas.

E a terceira era um pagamento que a Itália fazia à República para que esta *não *tivesse televisão – a fim de evitar a concorrência desleal de uma TV em italiano fora do controle italiano.

Quem freqüenta bancas de jornal, aqui, já viu selos bonitos à venda.

Uns deles são de Manama, uma cidade de Bahrein, no Golfo Pérsico. É uma filial de país emitindo selos.

Vi alguns de quadros impressionistas, com mulheres nuas.

Jogada genial, porque atrai tanto pela nudez feminina, quanto pelas artes plásticas.

Mas é óbvio que num país muçulmano, em que muitas mulheres usam véu, esses selos não circulam.

São emitidos só para exportação. (Por isso as federações de filatelistas negam que sejam selos: não passam de figurinhas coloridas).

O exemplo mostra que a soberania, simulada, pode servir para alguns trocados.

São Marinho vivia de não ter TV.

Tuvalu sobrevive de não ser, mais, TV.

A televisão não aceita concorrência.

Nem de países!

Fiquei chocado, no começo da década de 90, quando li o seguinte conto: no futuro, as seleções que disputariam a Copa do Mundo e as Olimpíadas seriam de empresas, e não de países.

Mas essa previsão já se realizou, com a Nike comprando a seleção brasileira de futebol – e engolimos isso.

O que resta aos micro-Estados é apenas o manejo de símbolos nacionais esvaziados: emitir selos que não circularão, ter um domínio na Internet que não usarão, poder ter uma TV que não existirá.

Os símbolos nacionais só rendem ao serem vendidos.

Por que falei disso?

Gabriel Priolli e eu discutimos, nas últimas semanas, como controlar a TV.

Concordamos que o Estado não é bom para isso.

Desconfiamos de um governo que tutele nossas escolhas.

Mas o poder de Estado, pelo menos, é eleito.

Já as TVs, quando falam em liberdade de imprensa, na verdade pensam em liberdade de empresa.

E a força desta prevalece sobre o próprio poder eleito.

Como poderemos nós, cidadãos, limitar o poder da telinha?

Eis a questão.

Mas para ela ainda não há resposta.