Por Sérgio Montenegro Filho Andei abordando em matéria publicada no JC por esses dias o tema da ética na política, assunto que se ainda não despontou na lista de interesses do cidadão brasileiro, ao menos tem chamado a atenção de forma indireta.
Pena que pela falta de ética dos nossos parlamentares.
A sucessão de escândalos vivenciada pelo Congresso Nacional nos últimos anos deixa clara a crise ética por que passa aquele Poder, que por ter o formato de representação democrática e plural, costuma ser visto como o mais próximo da sociedade. É claro que a corrupção e o abuso de poder não são males exclusivos do Brasil.
Até em países mais desenvolvidos existem bons e maus políticos.
Mas nós vivemos aqui, e por isso, nos cabe zelar pela preservação - ou restauração - da ética na nossa própria terra.
Numa lista rápida, ainda soam aos ouvidos grandes escândalos que abalaram as estruturas do Legislativo Federal. É só puxar pela memória: Renangate, mensalão, mensalinho, Sivam, esquema PC Farias, anões do orçamento, fraudes na Sudam e superfaturamento de obras públicas, violação do painel de votação, entre outros.
Onde entra a dificuldade ética, além, claro, da que se abate sobre os pivôs dos referidos escândalos?
Naqueles que, por puro corporativismo ou por comprometimento político, deixam impunes os colegas envolvidos diretamente nesses casos.
Como bem lembrou o professor Inácio Strieder, titular da disciplina de Ética no mestrado e doutorado em Filosofia da UFPE, a ética não se adapta às necessidades de cada um.
Ela é um conceito universal e sólido.
Vem da Grécia Antiga, e não é possível dar a desculpa de que se trata de um velho conceito, que carece de atualização.
Os três maiores pensadores gregos nos legaram conceitos sobre a ética que se entrelaçam.
Sócrates defendia que é apenas necessário saber o que é o “bem” para praticá-lo.
Platão, por sua vez, afirmava ser essencial o conhecimento sobre a idéia geral do “bem”.
Já para Aristóteles, o “bem” equivale à moderação das paixões.
A principal interseção no pensamento do “triunvirato” grego é que todos estabelecem como fonte da Ética a noção que a felicidade – traduzida no seu sentido mais amplo, em grego antigo, como eudaimonia – é a maior recompensa dos virtuosos.
Parece utópico?
Não deveria.
Afinal de contas, com que objetivo elegemos nossos representantes no Parlamento, senão o de tornarem as nossas vidas mais felizes?
E aí, traduza-se felicidade para bom português: saúde e educação de qualidade, moradia, emprego e renda.
Enfim, direitos básicos de que fala outro livrinho, não menos importante que os legados dos gregos: a Constituição Brasileira. É lamentável que, em vez de trabalharem nesse sentido, os parlamentares se dedicam à ação em benefício próprio.
Não fiz questão de ressalvar aqui as exceções.
Elas existem, mas parecem estar um tanto roucas ou mesmo amordaçadas.
Falta-lhes uma maior dose de coragem cívica para protestar contra a falta de ética dos colegas menos probos.
E aí, nivela-se o universo parlamentar por baixo.
Aliás, o teólogo e escritor Frei Betto - ex-assessor do presidente Lula, que deixou o cargo por discordar dos rumos éticos que o seu governo estava tomando - usa de um conceito fundamentado pelo educador Paulo Freire para fazer um alerta sobre a “relativização” da ética no Brasil.
Lembra que a classe política, na sua condição de detentora do poder, torna-se exemplo para a sociedade e ganha o direito de normatizar o que é ou não ético.
Sendo assim, no momento em que um parlamentar legisla ou usa sua influência política em proveito próprio, lega de exemplo ao povão instrumentos como o “jeitinho”, o nepotismo, o corporativismo.
E pior: a corrupção, a malversação e a locupletação com dinheiro público.
O mais grave é que, via de regra, o congressista age assim enquanto mantém uma fachada de defensor da moral.
E há quem acredite.
E vote nele novamente.
Esse mau político apela para a estética do bem, enquanto não o pratica.
Fica, portanto, o ensinamento de Frei Betto para reflexão: “Parecer ético é uma questão de estética, típica do oportunismo.
Ser ético, porém, é uma questão de caráter”.