Por Rogério Brandão O governo vem realizando um concentrado esforço político para prorrogar a CPMF, imposto por todos considerado injusto e extorsivo.

Esta já será a sua quarta prorrogação, tornando-o “provisório” apenas no nome conceitual.

A idéia original, apresentada em um momento de crise na saúde e se utilizando da autoridade moral de um dos mais respeitados nomes da medicina brasileira que é o dr.

Adib Jatene, seria alocar recursos para se oferecer um atendimento digno e justo de saúde no sistema público, dentro da filosofia do SUS.

Como quase tudo neste País, a idéia foi desvirtuada e hoje o dinheiro serve mais aos interesses políticos do que aos da saúde propriamente dita.

De norte a sul do País pipocam os escândalos e crises, decorrentes da péssima infra-estrutura da saúde pública e má remuneração dos serviços prestados.

Os hospitais, em crise, não têm como investir e incorporar os avanços tecnológicos.

Sobrevivem das migalhas que sobram, gerando déficits sucessivos.

Vejamos o exemplo do atendimento aos pacientes oncológicos.

Em novembro de 1998, isto é, há quase 10 anos, foi realizada a última atualização da tabela de procedimentos SUS em oncologia.

De lá para cá, houve um enorme ganho em tecnologia e desenvolvimento de drogas, que melhoram em muito as taxas de cura e sobrevida global dos pacientes.

Podemos também estimar uma inflação acumulada de aproximadamente 85% no período.

A única incorporação de droga no período ocorreu em 2001, com a inclusão do Imatinib, utilizado no tratamento de leucemia mielóide crônica e tumores GIST, e mesmo assim, com transferência de parte dos recursos para os prestadores dos serviços, isto é, parte do custo deste tratamento é financiado pelos próprios prestadores, o que, convenhamos, é um absurdo!

Desde o ano de 2004 a Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica tenta negociar com o governo uma atualização dessa tabela, permitindo a incorporação de novos e modernos tratamentos.

Após muitas idas e vindas, onde se pode constatar haver muita desinformação, desorganização e falta de interesse real do governo, no que pese o consenso de opinião dos que fazem a política de câncer do País, o governo mais uma vez decidiu nada decidir!

O representante do Ministério da Saúde alega não haver recursos financeiros para a correção das tabelas.

Sua proposta foi mesmo indecente, pois reduz o pagamento de procedimentos ainda superavitários.

Oitenta e cinco por cento dos atendimentos oncológicos são realizados no sistema SUS.

Este ano são esperados aproximadamente cerca de 600 mil novos casos de câncer.

Esta política oficial condena estes pacientes a uma qualidade de vida e resultados terapêuticos inferiores aos usuários de planos de saúde e privados.

Como cancerologista, tenho certeza de que os pacientes do SUS são subtratados, o que é injusto.

Já tivemos um apagão elétrico, um apagão aéreo.

Vivemos um contínuo apagão moral com escândalos sucessivos. É de se questionar qual o real destino dos nossos tantos impostos, que não seja a manutenção dos inúmeros privilégios dos poderosos.

Não podemos compactuar com a política de terra arrasada na saúde.

Já é mais do que tempo de a sociedade se indignar, protestar, cobrar, exigir do governo mais seriedade e justiça social.

Ninguém pode aceitar que, por falta de recursos, hospitais sejam ineficientes e sucateados.

A sociedade mobilizada pode mudar este trágico destino, que torna cada vez mais distante o sonhado futuro deste País.

PS: Rogério Brandão é médico cancerologista clínico.