O advogado e jurista José Paulo Cavalcanti Filho avaliou, em entrevista ao Blog, na tarde desta quinta (30), que o jornal O Globo tinha sim o direito de publicar a matéria revelando a troca de emails entre os ministros do STF, Ricardo Lewandowski e Cármen Lúcia, durante o julgamento do mensalão, na semana passada. “Naquela sessão, tínhamos uma instituição pública (STF), numa sessão pública, com computadores públicos, operados por funcionários públicos.
Nada era privado.
Nada.
Absolutamente nada”, disse.
Como se sabe, um fotógrafo do jornal O Globo clicou a tela dos notebooks e, no dia seguinte, foram publicados trechos dos diálogos entre os ministros do STF.
A Folha de S.
Paulo, que tinha o mesmo material, foi desaconselhada por seu departamento jurídico.
E tomou o furo, junto com o resto da imprensa que cobria as sessões no plenário. “A reportagem prestou grande grande serviço à democracia ao sugerir que haveria compromissos outros que não a consciência do juiz”, disse o jurista.
Na conversa, Lewandowski e Carmen Lúcia trocaram, por exemplo, impressões sobre como seria o voto de seus pares.
Também especularam que alguns ministros poderiam trocar o voto pela nomeação da 11a cadeira do STF, vaga com a aposentadoria de Sepúlveda Pertence.
FALANDO BAIXO Para José Paulo Cavalcanti Filho, a troca de emails flagrada pelo fotógrafo de O Globo se assemelha a alguém falando baixo em local público.
Neste caso, especialmente em se tratando de funcionários públicos, não se pode exigir privacidade.
Aliás, o próprio ministro Lewandowski acabou se envolvendo, anteontem (terça, 28) em mais um episódio de indiscrição.
Em um resturante em Brasília, falou ao telefone celular, usando um tom que pôde ser perfeitamente ouvido por uma jornalista da Folha de S.
Paulo.
Dessa vez, o jornal não titubeou.
E publicou as falas de Lewandowski, segundo as quais haveria no STF uma tendência de não se aceitar as denúncias contra os acusados de mensalção.
O ministro chegou a dizer no telefonema indiscreto que seus colegas se sentiram acuados pela imprenda depois da publicação da matéria de O Globo. “O resultado do julgamento foi exemplar para a democracia”, opinou José Paulo Cavalcanti Filho. “Para os que estão convencidos do voto, a imprensa não representa uma ameaça.
E em benefício do ministro Lewandowski, diga-se que ele votou de acordo com sua consciência, não tendo do que se arrepender”.
De fato, o ministro votou contra a aceitação das denúncias sobre José Dirceu e foi voto vencido.
DIREITOS CONFLITANTES José Paulo Cavalcanti Filho avaliou que a polêmica sobre a publicação ou não da matéia com as concversas dos ministros do STF, surgiu por conta de um conflito entre direitos: à privacidade e à informação. “Quando se tem de fazer esta opção entre os dois direitos, a escolha prevalente no planeta Terra é fazer valer o direito coletivo, que é o direito à informação”, contou.
Segundo ele, os países desenvolvidos dispõem de leis específicas para regular a privacidade, a informação e o conflito entre elas.
O Brasil não tem nada parecido.
O jurista lembrou que incluiu um dispositivo regulando estes direitos em um projeto de Lei de Imprensa aprovado há dez anos na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara. “Eventuais conflitos entre direito de informação e privacidade serão sempre resolvidos em favor do interesse coletivo da informação”, diz o texto da lei, até hoje não votado em plenário.
Para ele, que está concluindo um livro que deve se chamar justamente “Direito à Informação”, o direito à privacidade deve variar de pessoa para pessoa.
Explicando melhor: “Um homem do povo em questões que digam respeito a sua vida pessoal, têm direito quase absoluto à privacidade.
O presidente tem quase nenhum, mesmo em questõe pessoais”, afirmou. “Há uma gradação, em função das responsabilidades públicas específicas dos cargos assumidos”, explicou José Paulo, que já foi secretário-geral do Ministério da Justiça e ministro interino no governo Sarney.
Veja o que já publicamos sobre o caso aqui.