A defesa da CPMF Por José Luiz Delgado, em Opinião do JC Impressiona como a grande elite brasileira placidamente se dispõe a (e pensa que pode) manipular e usar todas as classes sociais abaixo dela, a começar pela classe média. É exatamente o caso da atual e imensa campanha contra a CPMF.

Pretende-se (em primeiro lugar a ilustre Fiesp de São Paulo, é óbvio) que se trata de carga tributária excessiva e que toda a população brasileira quer ser desonerada desse ônus.

Argumentam ainda que não há muita transparência no uso desses recursos e que sua finalidade primordial, o fortale-cimento das receitas para a Saúde, veio sendo desviada.

Promovem então farta campanha, inclusive com abaixo-assinados aos milhares, para enganar os ingênuos que se sentem sinceramente esmagados com a absurda carga tributária do Brasil. É verdade que a carga tributária que pesa sobre o cidadão comum é muito alta. É verdade que a finalidade primordial da CPMF foi deturpada, já no governo que a instituiu, o do senhor FHC, que, para instituí-la, serviu-se do prestígio do honrado ministro Adib Jatene e, tão logo a conseguiu, livrou-se despudoradamente dele, para poder usar a CPMF como quisesse – conforme denúncia surpreendente e corajosa de um ministro da Saúde posterior, o senhor José Serra. É verdade ainda que esse tributo, sob a forma de contribuição, não é partilhado pelos Estados e municípios, o que, além de injusto, somente acentua a centralização financeira que corrói a federação brasileira.

Tudo isso é verdade, mas é mentira que os promotores dessa resistência contra a CPMF estejam minimamente preocupados com a carga tri-butária que pesa sobre a população em geral.

Estão preocupados, isto sim, com a carga tributária que pesa sobre os seus próprios bolsos.

E por isto investem contra a CPMF, e somente contra a CPMF.

Porque a CPMF é provavelmente o único imposto que os grandes ricos do Brasil pagam.

Dos outros impostos diretos conseguem eles se safar espertissimamente, por mil e uma manobras contábeis, e os indiretos, como o IPI ou o ICMS, na verdade são transferidos para os consumidores, que são, em última análise, os que verdadeiramente os pagam.

Já se disse que, no Brasil, somente os pobres e os trouxas pagam impostos.

Com a CPMF, no entanto, é diferente.

Incidindo diretamente sobre as operações financeiras, os grandes, que não hão de guardar seus imen-sos dinheirinhos debaixo dos colchões, não conseguem fugir dela – ultraje que não podem tolerar: que haja, afinal, no Brasil, um imposto que eles efetivamente paguem, um imposto que saia dos seus bolsos.

Acresce que a CPMF permite, pelo cruzamento de dados por parte da Receita, examinar a veracidade de outros tributos que a elite deveria pagar, e possibilita assim a identificação de alguns grandes sonegadores e a descoberta de imensas fortunas inexplicadas.

Podem eles admitir a continuidade de tributo assim tão terrivelmente perigoso?

Se há um imposto que eu pago feliz e satisfeito da vida é a CPMF.

Porque é praticamente o único que a alta burguesia nacional é obriga-da a pagar.

O único que, por incidir sobre o cheque, atinge os ricões que conseguem burlar todos os outros.

Querem de fato reduzir a imensa carga tributária?

Por que não promover, por exemplo, a diminuição das alíquotas dos tributos – do imposto de renda, do IPI, do ICMS?

Ou, para ficarmos no caso da CPMF, por que não admitir que o total da CPMF pago por cada cidadão seja abatido de sua declaração anual do Imposto de Renda (o que ainda serviria para fiscalizar o efetivo recolhimento da CPMF, pelos bancos)?

Essas medidas, sim, interessam à imensa maioria da população brasileira.

Não a extinção da CPMF, que só aparentemente beneficiaria a todos.

Sua extinção favoreceria apenas a mais do que privilegiada elite brasileira.

Trata-se, esta agora, de ardilosa e hipócrita campanha, somente para iludir os cidadãos de boa-fé.

Precisamos, sim, é de uma campanha pela manutenção da CPMF e até por sua transformação em imposto permanente.

PS: José Luiz Delgado é professor universitário.