Por Jayme Asfora Um caso que poderia ser bastante pitoresco - se não tivesse contido em si um exemplo do sentimento discriminatório que permeia muitas vezes a estrutura do Judiciário brasileiro - chamou a atenção em todo o País.
O juiz Bento Luiz de Azambuja Moreira da 3ª Vara trabalhista de Cascavel, no Paraná, suspendeu uma audiência porque o reclamante usava chinelos de dedo.
Em sua justificativa, o calçado era incompatível com a dignidade do Poder Judiciário.
Como se um trabalhador humilde, sem recursos sequer para comprar um sapato fechado, fosse um ser indigno ou de segunda classe.
Como explicar ao trabalhador rural Joanir Pereira que ele, por causa dos chinelos, não tinha direito a estar presente na audiência em que discutia a sua indenização - calculada, inicialmente, em R$ 10 mil e, posteriormente, negociada entre as partes em R$ 1,8 mil - mas que o Brasil convive sem problemas com casos de juízes, governantes e parlamentares envolvidos em fraudes e desvios de recursos que, na maioria dos casos, somam milhões de reais?
E que esses mesmos envolvidos chegam a figurar em capas de revista e colunas sociais durante festas e banquetes onde os gastos não têm limites?
Como explicar ao Sr.
Joanir Pereira que a Constituição Federal prevê, em seu artigo 5º, que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, mas que o juiz Azambuja Moreira - que teria o papel de zelar pelo cumprimento da Constituição - prega a discriminação de classe?
Ou como fazê-lo entender o caso dos cinco rapazes cariocas que espancaram a doméstica Sirlei Dias de Carvalho e que, em suas justificativas, disseram que a confundiram com uma prostituta?
Então prostitutas e domésticas são diferentes dos outros brasileiros?
Para impedirmos que condutas abusivas como estas ocorram, novamente, é preciso denunciar e agir.
Buscando, por exemplo, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e as corregedorias de Justiça nos âmbitos estaduais ou locais para que o magistrado seja constrangido e também punido.
Não podemos falar em um País melhor enquanto a cultura da discriminação passa pelo Judiciário, pela classe média, e por todos aqueles que, em tese, deveriam ser formadores de opinião.
Mas foi o mesmo Sr.
Joanir Pereira que nos deu o exemplo de que o Brasil, de fato, ainda pode melhorar.
Assim fez quando, ontem, decidiu pegar emprestado o sapato do sogro - dois números maior do que seu - e recusou-se a receber, de presente, o par de sapatos levados pelo juiz.
Belo exemplo Sr.
Joanir.
PS: Jayme Asfora é presidente da OAB-PE e escreve para o blog às quintas.