Valor Econômico Após a seca que vitimou 1,7 milhão de pessoas entre 1877 e 1879, engenheiros a serviço do imperador Dom Pedro II produziram o mapa de um canal de interligação do rio São Francisco com o Jaguaribe, no Ceará.
Levou quase um século e meio, mas as obras de transposição do projeto de infra-estrutura mais antigo do país finalmente vão começar.
Na semana que vem, quatro batalhões do 1 Grupamento de Engenharia do Exército, sediado em João Pessoa (PB), instalam seus canteiros nos municípios de Cabrobó e Floresta (PE).
No dia 25 de junho, iniciam trabalhos de terraplenagem e escavações dos futuros canais de aproximação.
O Ministério da Integração Nacional repassou R$ 104 milhões ao Exército, dos quais R$ 30 milhões já foram gastos na compra de equipamentos.
De acordo com o engenheiro Rômulo de Macedo Vieira, coordenador-geral do Projeto São Francisco, serão mobilizadas 260 pessoas (boa parte soldados) e 42 profissionais (engenheiros e técnicos).
Os militares ficarão responsáveis pela construção dos canais de aproximação, que vão ligar o São Francisco às estações de bombeamento das águas nos dois futuros eixos da transposição: Norte e Leste.
Em Cabrobó, será um canal de três quilômetros; em Floresta, seis quilômetros.
As obras sob comando do Exército, que incluem a abertura de estradas conectando rodovias maiores às estações de bombeamento, devem durar três anos.
A construção das estações será feita pela iniciativa privada.
Os resultados da licitação de R$ 3,2 bilhões para as obras civis, divididas em 14 lotes, só serão conhecidos no fim de 2007.
Dois lotes - um em cada eixo - são específicos para as estações. “É uma forma de trazer empresas especializadas nisso e reduzir custo”, afirmou Macedo.
Ao todo, foram apresentadas 76 propostas, incluindo ofertas das principais empreiteiras do país - Odebrecht, Andrade Gutierrez, Queiroz Galvão, Mendes Junior, Camargo Corrêa, Schahin e OAS.
Ontem, o Ministério da Integração Nacional fez consulta à Advocacia-Geral da União para tentar excluir da licitação a Gautama, empreiteira envolvida nas investigações da Operação Navalha, da Polícia Federal.
A Gautama integra um consórcio de empresas que apresentou proposta para o lote 8.
A fabricação de 18 moto-bombas, para aduzir as águas do rio, já foi contratada junto a multinacionais com plantas no Brasil.
Foi resultado de outra licitação, no valor total de R$ 147 milhões, e os equipamentos serão instalados daqui a cerca de dois anos.
Macedo está convencido de que o início das obras é, finalmente, irreversível. “Já derrubamos mais de 20 liminares.
Agora se criou uma certa jurisprudência em torno da obra e não há fatos novos”, observou o coordenador do projeto, confiante na ausência de novas medidas judiciais que atrasem o cronograma.
Segundo ele, não será possível concluir todo o empreendimento até o fim do governo Lula.
Mas ficará tudo bem encaminhado: o eixo Leste (que beneficiará Pernambuco e Paraíba) estará 100% pronto em 2010 e o eixo Norte (que contemplará Pernambuco, Ceará, uma pequena parte da Paraíba e do Rio Grande do Norte) terá 60% das obras concluídas.
Ironicamente, a pedra fundamental do empreendimento será lançada por um ministro - Geddel Vieira Lima - que vem de um Estado, a Bahia, contrário à transposição.
Na primeira quinzena de junho, o próprio Geddel fará uma expedição de cinco dias ao longo do São Francisco.
A viagem começará na nascente do rio, em Minas Gerais, e acabará em Penedo (AL), na foz do Velho Chico.
O ministro pretende encontrar-se com líderes comunitários, religiosos e políticos para rebater pessoalmente as críticas às obras de transposição.
Ao mesmo tempo em que Geddel fará o corpo-a-corpo da discussão, a Secretaria de Comunicação Social (Secom) da Presidência da República planeja campanha publicitária para tentar convencer os nordestinos sobre os benefícios do projeto.
Segundo um assessor direto do ministro, a idéia é fazer inserções em rádio, televisão e grandes jornais.
Não será uma peça de propaganda, mas uma campanha institucional de esclarecimento da população, diz o assessor.