"1º de MAIO, o que realmente se comemora?" Por Breno Rocha* Sempre que se ouve qualquer referência histórica sobre o 1º de maio, imediatamente nos remetemos ao 1 de maio de 1886; à greve-geral em Chicago e aos enforcamentos dos seus líderes, em praça pública.

Assim, o 1º de Maio vem se configurando como uma data de referência de luta por melhores condições de trabalho, pela redução das horas trabalhadas, entre outras, e também numa data de LUTO, pelos mártires de Chicago.

Entretanto há um significado original na criação do Dia Mundial do Trabalho, que vem sendo abandonado com o passar dos anos e que deve ser resgatado, sob pena de uma data tão relevante passar, paulatinamente, a ser apenas mais um dia de descanso.

O Dia do Trabalho foi criado oficialmente em Paris, durante o Congresso da Internacional Socialista, no ano de 1889 – oprtanto, três anos após a greve-geral de Chicago.

E a data, apesar de resgatar o simbolismo dos eventos ocorridos durante os protestos nos Estados Unidos, visa propor uma reflexão geral sobre uma força social e produtiva que foi responsável pela humanização da nossa espécie.

Daí sua suprema relevância!

A aproximadamente uma década antes do referido Congresso ocorrer em Paris, Karl Marx, o filósofo dos trabalhadores, descobriu (ou, inventou) o Homo faber, aquele que, de certa maneira, para ele seria a evolução do Homo sapiens.

Esse Homo Faber haveria evoluído dos seus ancestrais através do trabalho.

Mas, é preciso que se diga, não através de qualquer trabalho.

Nem do trabalho pura e simplesmente, pois, em sua condição mais primitiva o trabalho já existia na natureza antes do homem.

Afinal, a formiga trabalha, as abelhas trabalham e os pássaros trabalham na construção de seus ninhos.

E foi observando a natureza que a espécie humana aprendeu a trabalhar.

O joão-de-barro, por exemplo, pode ter sido o inspirador da vocação arquitetônica e de engenharia humana, sendo, deste modo, um dos responsáveis por termos finalmente trocado as cavernas pelos modernos apartamentos com suas altíssimas e luxuosas coberturas.

Por outro lado, bem poderia a espécie humana ter estagnado na produção material apenas para a subsistência, assim como as outras espécies para as quais o trabalho não impulsionou a evolução histórica e social.

Mas, conosco, havia um componente diferente: somos capazes de refletir sobre o trabalho.

Foi esta capacidade que nos permitiu evoluir e é esta capacidade que se buscava, originariamente, comemorar com a data de 1º de maio.

Ao refletirmos sobre o nosso próprio trabalho inventamos a cultura humana; isto é, promovemos a transformação da natureza a partir da reflexão das nossas atividades, ou, se preferirmos a explicação do poeta “marchamos sobre o chão donos do sim e do não”.

As formigas e as abelhas são capazes de mudar a paisagem, de polinizar as flores, enfim, de transformar a natureza, mas, sem a capacidade de refletir sobre tal transformação, a realizam repetitivamente, instintivamente, como parte dessa mesma natureza que paradoxalmente mantêm quando transformam.

Os seres humanos, por sua vez, refletem sobre o trabalho que executam e quando fazem isto o trabalho deixa de ser um ato instintivo e se transforma em “força social”; força tão poderosa que tem sido capaz não apenas de transformar a natureza, mas, com isso, de arrancar o ser humano do seu estado primitivo e transportá-lo pelos planetas e galáxias.

O 1º de Maio comemora a existência dessa “força social”, ou seja, do trabalho humano que quando é refletido se consolida em força transformadora.

Por isso a escolha da data em alusão à greve de Chicago é tão pertinente.

Porque foi a partir da reflexão sobre o seu trabalho que os grevistas de 1886 perceberam que poderiam usá-lo como força social para reduzir a jornada de trabalho de 13 para 8 horas diárias.

O Congresso de Paris poderia ter escolhido como símbolo a “greve” dos escravos romanos, liderada por Spartacus, o grego que reuniu os gladiadores e congregou-os a pararem de se matar apenas para a diversão dos poderosos.

Com a recusa dos gladiadores em “trabalhar”, milhares de escravos das outras atividades, ao saber da notícia, foram aos poucos aderindo ao “movimento” e também se recusando total ou parcialmente atrabalhar, o que levou o todo poderoso Império Romano a um colapso social; sendo essa, talvez, a primeira demonstração histórica da “força social” do trabalho.

A escolha teria o mesmo sentido.

Porém, a greve de Chicago tinha a data mais próxima, sensibilizava mais.

De qualquer forma, o importante hoje é não perdermos este referencial: comemoramos o Dia do Trabalho, mas não do trabalho mecânico, repetitivo ou instintivo.

Não comemoramos o trabalho dos pássaros ou dos insetos, nem das máquinas ou dos autômatos.

Comemoramos o dia da força social transformadora e humanizante que foi capaz de arrancar os homens da caverna e arremessá-los ao espaço sideral… e que ainda pode fazer mais, pode por fim à fome, às guerras e, oxalá, à exploração do homem pelo seu semelhante.

PS: Breno Rocha é Presidente do Sindicato dos Agentes e Servidores no Sistema Penitenciário do Estado de Pernambuco – SINDASP