Por Edilson SilvaEsta semana o governo Eduardo Campos ultrapassou a barreira dos primeiros cem dias de gestão.

Em tão pouco tempo somente uma oposição cega faria um balanço definitivo.

Por outro lado, só um adesismo fanático e interessado poderia fazer um balanço positivo.A oposição ressentida, desqualificada e de direita, residente na Assembléia Legislativa, formada, dentre outros, por um ex-fervoroso arraesista, hoje convertido a outros "istas", fez sua parte no circo dos 100 dias.

Bate-boca com o líder do governo na casa, muita encenação para os jornais e até descoberta de hospital em Abreu e Lima.Longe das avaliações apaixonadas e esvaziadas do interesse coletivo da sociedade, o PSOL, Partido Socialismo e Liberdade, lançou esta semana o seu jornal estadual, tendo como páginas centrais uma avaliação destes 100 dias.

Dividiu esta avaliação em 12 tópicos, que discorreremos superficialmente aseguir.

SOCIEDADE CIVIL O primeiro aspecto a ser considerado nestes cem dias é que Eduardo Campos está ocupando um vácuo político e administrativo, representado pela era Jarbas/Mendoncinha.

Pernambuco era um estado sem governo, ausente enquantotal em áreas vitais como educação, saúde, segurança e fisco, e ao mesmo tempo extremamente presente na sua relação truculenta e arrogante com a sociedade civil e seus movimentos sociais.O simples aceno de Eduardo Campos para o diálogo com a sociedade civil torna-o progressivo.

Ou seja, o gesto natural em qualquer governo democrático, de receber, ouvir, criar espaços de cooperação com atores sociais relevantes, torna-se um diferencial em função da mediocridade política do governo anterior.No entanto, entre a saudável abertura de diálogo e a busca da cooptação e posterior conivência com o governo existe uma linha muito fina, vide governos Lula e João Paulo no Recife.

Torço para que não aconteça no governo estadual.

FUNCIONALISMO E NEPOTISMO Na formação de sua equipe, o governo mostrou seus limites estratégicos na questão da democratização e transparência do estado e no combate à corrupção, ao estabelecer um loteamento vergonhoso de cargos comissionados.Pelo menos no 2º e 3º escalões deveriam ser utilizados servidores públicos, o que levaria o Estado a ter uma política permanente de qualificação técnica de seus servidores nas mais diversas áreas.

Mas, em detrimento da utilização de servidores de carreira, vimos cabos eleitorais e seus interesses privados se sobrepondo aos interesses do conjunto da sociedade.Na questão do combate ao nepotismo, este loteamento entre aliados mantém as portas abertas para que os parentes dos comissionados cumpram o papel de hienas no serviço público.

A escolha do atual Procurador Geral de Justiça, a contragosto da maioria dos membros do Ministério Público, que vinhamcombatendo sem tréguas o nepotismo no estado, é explicativa.

A articulação política que se fechou com Guilherme Uchoa na presidência da Assembléia Legislativa é mais que explicativa.

O envio de um Projeto de Lei Anti-Nepotismo para esta Assembléia Legislativa, após lotar o estado de cabos eleitorais e anular o Ministério Público, mostra como Eduardo Campossubestima a nossa mínima inteligência.

CAIXA-PRETA DAS CONTAS Ainda nos aspectos de concepção da gestão, o Portal da Transparência é ainda mais revelador do estilo midiático do atual governo.

A caixa-preta do Siafem, tão criticada na era Jarbas/Mendoncinha, continua trancada.

O Portal da Transparência não passa de propaganda institucional, com dados genéricos sobre a gestão fiscal do governo. É progressivo em relação ao governo anterior, que divulgava dados em níveis semelhantes de detalhes, porém em veículos mais restritos, como o site da Secretaria da Fazenda.

O tal Portal constitui-se essencialmente em mais uma jogada de marketing da gestão.EDUCAÇÃO Na educação, mesmo tendo os instrumentos legais para atacar de frente nestes 100 dias o problema da precarização dos professores, o governo preferiu manter a política de contratos temporários, indo de encontro à necessidade de milhares de alunos, professores concursados e à Justiça, que já determinou a superação deste quadro.SAÚDE Na saúde, o governo passou os primeiros 99 dias reclamando de rombos da gestão anterior e anunciando restrição orçamentária.

No centésimo dia, subiu um pouco a altura do palanque, que ainda não foi desmontado, para anunciarque "iniciará" a construção do primeiro dos três hospitais prometidos em campanha.

Uma dose mínima de compromisso com suas promessas teria o levado a não utilizar o verbo no tempo futuro, mas sim no presente.

Nenhum hospital está sendo construído.

Serão, no futuro.

Mais promessas.

TRANSPORTES O Secretário de Transportes, Sebastião Oliveira, já abriu o caminho político para colocar pedágio na BR 232, ao declarar na imprensa que a privatização não está descartada.

Nada de auditoria na obra de duplicação repleta de suspeitas.A EMTU, que já teve sua extinção anunciada, nestes 100 dias protagonizou o escândalo da tentativa de retirada do seguro obrigatório contra acidentes, pago pelas empresas.

O futuro Consórcio Metropolitano, que pretende substituir a EMTU, nas palavras do próprio Eduardo Campos, deverá combater o "transporte irregular".

Ou seja, kombeiros e alternativos de Olinda, Camaragibe, Jaboatão, São Lourenço e demais municípios da Região Metropolitana, devem se preparar para mais desemprego.

AUMENTO DA LUZ O caso da Celpe fala por si.

Os recursos digitais disponíveis hoje permitem que a população tenha acesso fácil às declarações contundentes de Eduardo Campos no período da campanha.

Dizia ele: "podem cobrar a redução da tarifa de energia elétrica!".

A Celpe já requereu reajuste da tarifa junto a Aneel e o governo se limita, com a mesma contundência do período da campanha, a afirmar que vai participar das discussões.DESENVOLVIMENTO A política de desenvolvimento do governo não existe. É o PAC de Lula e a panacéia de Suape.

Concentração de investimento em uma mesma região, concentração de renda, pouquíssimos empregos, agressão concentrada ao meio ambiente e aceleração da favelização de Ipojuca.

Até aqui, portanto, sequeranúncio de que o governo do Estado subsidiará a interiorização do crescimento e do desenvolvimento do Estado.Dois projetos que em tese ajudariam na interiorização do desenvolvimento, a Transnordestina e a Transposição do São Francisco, podem se converter em duas catástrofes: uma econômica e social, e a outra ambiental.

Sobre os trilhos da Transnordestina poderão escorrer para a região de Ipojuca cadeias produtivas, como a do gesso do Araripe.

A Transposição das águas do Velho Chico, em tempos de aquecimento global, é uma insanidade completa.SEGURANÇA Por incrível que pareça, foi na área de segurança pública que o governo tomou medidas mais corajosas e que podem ter dimensão de caráter mais estratégico, que vão além dos limites de governo e avançam para políticas de estado.

O fim da Lei Seca e a reestruturação da Polícia Civil estão entre estas medidas.

A presença de um sociólogo na coordenação do planejamento da área de segurança pública mostra, pelo menos em tese, que o atual governo percebeu que a violência não é caso somente de polícia.

Esperamos que perceba também que sem geração de emprego e renda não há saída.

Até aqui, portanto, "a montanha pariu um rato".

E pelo ajuste do leme da gestão, tudo indica que daqui pra frente será mais do mesmo.

Mas, neste caso, as previsões sofrem do mesmo mal das promessas.

Acompanharemos, na condição de oposição popular de esquerda, o desenrolar dos próximos dias,meses e anos.

PS: Edilson SIlva é presidente do PSOL/PE, foi candidato ao governo do Estado em 2006 e escreve todas as sextas-feiras para o Blog do Jamildo / Jornal do Commércio.