O governo do presidente Lula, aliado de Eduardo Campos, acaba de dar uma ajudinha providencial para a Termocuiabá, que compra gás natural de Furnas, fornecido pela Bolívia de Evo Morales.

Com o aumento imposto pelo país vizinho, a empresa privada teve um aumento de sua matéria-prima e, para evitar o repasse para as tarifas, a União aceitou diluir o custo dividindo a conta com todo o sistema interligado nacional, a mesma proposta que foi feita para reduzir os impactos da Termopernambuco na conta de luz da Celpe, sem sucesso.

Até aqui, não se ouviu uma palavra dos petistas como Sérgio Leite (PT), que tanto esperneou contra o aumento da Celpe, no ano passado.

O quase líder do governo na Câmara, Maurício Rands, idem, pelo menos até aqui.

Na campanha eleitoral, o candidato socialista Eduardo Campos fez dos efeitos dos reajustes cavalo de batalha, mas ainda não se ouviu de sua parte nenhuma crítica ou gestão para beneficiar os pernambucanos com igual ajuda.

Seria uma maneira de cumprir sua promessa de reduzir a conta, sem abrir mão do ICMS.

O vetor à iniciativa de diluir no sistema nacional os custos da Termopernambuco/Celpe coube à ministra da Casa civil, Dilma Rousseff.

Corria ainda o governo Mendonça Filho, que viria a disputar a reeleição, contra Eduardo Campos, sem êxito, curiosamente em grande parte em função da polêmica do aumento das tarifas que o PT, aliado de Lula, não esforçou-se para tirar do papel.

Quem explica a incoerência de forma clara é um engenheiro da Chesf, no site Ilumina.

Vale a pena lê-lo.

Privatizando lucros e socializando prejuízosPor José Antonio Feijó de Melo Quando o Presidente Evo Morales decretou a nacionalização dos recursos naturais do seu País, envolvendo interesses do Brasil, seja quanto às instalações da Petrobrás existentes na Bolívia, seja quanto à importação do gás natural boliviano hoje de fundamental importância para a economia brasileira, o governo Lula soube enfrentar a crise de forma sensata, com moderação e responsabilidade, utilizando-se essencialmente dos canais de negociação diplomática e do entendimento direto da própria Petrobrás com as autoridades bolivianas.

Como cidadão, concordando com essa linha de ação, e a despeito das severas porém injustas críticas de certos setores da imprensa, desde o primeiro momento considerei correta a posição assumida pelo Governo.

Assim, para mim não surpreendem os resultados positivos que ambos os Países vêm alcançando através das negociações, tanto quanto à questão central da importação do gás e do seu preço, como sobre os interesses da Petrobrás em solo boliviano.

Entretanto, apesar disso, hoje considero necessário vir a público para manifestar discordância sobre a forma de envolvimento do Governo no caso particular da importação direta de gás pela Termocuiabá e, em conseqüência, condenar veementemente a lamentável, absurda e ao meu ver ilegal decisão de transferir a todos os consumidores do sistema interligado nacional o diferencial de custo da energia gerada pela referida termoelétrica, resultante da elevação brusca e extraordinária do preço do gás fornecido pela Bolívia.

Com efeito, a Termocuiabá é uma empresa privada, não concessionária do serviço público de energia elétrica, caracterizada legalmente como uma "autorizada" na condição de Produtor Independente de Energia (PIE) o que, nos termos da lei, significa que está autorizada a atuar no mercado de energia elétrica por sua conta e risco.

Sem dúvida, foi nesta condição de empresa privada, por sinal controlada por uma multinacional, que a referida empresa negociou e celebrou contrato de compra de gás natural diretamente com entidade boliviana, sem participação do Governo brasileiro nem da Petrobrás.

Aliás, o preço extremamente favorável de US$ 1,19 por milhão de BTU que estava vigorando para a Termocuiabá, decorrente de negociação e contratação anteriores ao Governo Evo Morales, sugere a possibilidade da ocorrência de métodos pouco ortodoxos na referida contratação, que certamente trouxeram grandes prejuízos ao Estado boliviano, mas provavelmente vantagens pessoais para algum ou alguns dos negociadores andinos e, com certeza, grandes lucros para a Termocuiabá.

Note-se que a famosa "Enron" era uma das sócias da referida Térmica.

Nestas condições, deve-se reconhecer como legítimo o desejo do atual governo da Bolívia de renegociar esse contrato.

Porém, sendo a Termocuiabá uma empresa brasileira, deve-se também reconhecer que a mesma tem todo o direito de receber apoio político e diplomático do Governo brasileiro em tal renegociação.

No entanto, respeitados os termos básicos do contrato original e os preceitos do direito internacional pertinentes, não mais competiria ao poder público nacional qualquer interferência direta no caso.

E muito menos na forma em que agora se anunciou, isto é, determinando a transferência a todos os consumidores do SIN dos custos da elevação do preço do gás natural que a Termocuiabá recebe diretamente da Bolívia para gerar cerca de 400MW médios vendidos a FURNAS, o qual está subindo de US$ 1,19 para US$ 4,20 por milhão de BTU (252,9%).

Não importa se isto representará apenas um pequeno acréscimo de 0,2% nas tarifas.

A questão não é de montante, mas de princípio.

Como antes mencionado, a Termocuiabá atua no mercado por sua conta e risco e, se ela não dividiu com os consumidores os extraordinários lucros que deve ter acumulado nos vários anos em que recebeu o gás a tão baixo preço, agora deve arcar com o ônus da elevação de custo de sua matéria prima.

Esta é a regra normal do capitalismo, que intrinsecamente envolve riscos.

O contrário será a consagração da velha máxima tão ao gosto do "capitalismo a brasileira" - a privatização dos lucros e a socialização dos prejuízos.

Não obstante, se por absurdo os seus contratos de venda lhe permitirem repassar tão elevados e extraordinários acréscimos, que os respectivos compradores de sua energia, signatários dos correspondentes contratos, arquem com as conseqüências, jamais os consumidores de todo o sistema interligado.

Aliás, guardadas as devidas especificidades, este é um caso absolutamente similar ao que vêm ocorrendo em Pernambuco desde 2004, onde um contrato de compra de 390 MW médios da TERMOPERNAMBUCO, sozinho, está impactando a tarifa da distribuidora estadual, CELPE, em cerca de 20%, enquanto uma proposta de que este impacto fosse diluído no sistema interligado nacional foi de pronto rejeitada pelo Governo e pela ANEEL.

Portanto, não pode ser agora que um aumento de preço da energia da Temocuiabá deva receber tratamento diferenciado para estender-se a todos os consumidores do SIN.

No máximo, para equivaler ao caso de Pernambuco, deveria aplicar-se apenas para aqueles que compram energia de FURNAS, nunca para todo o País Assim, se o Governo e a ANEEL mantiverem a decisão de que o custo adicional da energia da Termocuiabá provocado pela elevação do preço do gás boliviano seja diluído com todas os consumidores, estarão na obrigação de fazer o mesmo com a energia da TERMOPERNAMBUCO vendida à CELPE, diluindo-a também em todo o sistema interligado.

Afinal, também seria apenas algo próximo de 0,2% de acréscimo nas tarifas (390 MW médios da TERMOPERNAMBUCO e 400 MW médios da Termocuiabá).

Naturalmente, nesta hipótese, a regra deveria ser estendida a todos os casos similares eventualmente existentes, de modo a se seguir à risca a sábia recomendação do Barão de Itararé - "ou nos locupletemos todos ou implantemos a moralidade".

Recife, 21 de fevereiro de 2007.Eng.

José Antonio Feijó de MeloDiretor ILUMINA-NE