Ivete Sangalo e Maria da Vila Por ADRIANO OLIVEIRA Fiquei espantado com as cenas de violência ocorridas no penúltimo domingo em Boa Viagem.
Contudo, o que vem me causando maior espanto são as cobranças feitas à Polícia Militar de Pernambuco (PMPE).
Essas cobranças advêm da mídia, de parlamentares oportunistas e dos freqüentadores do bloco Balança Rolha.
O porquê do meu espanto?
Para freqüentar o Balança Rolha é preciso pagar, o desfile ocorreu na Avenida Boa Viagem, espaço público, Ivete Sangalo, por sua fama, atrai milhares de pessoas em qualquer lugar do País.
Portanto, por que cobrar da PMPE mais policiamento?
Se o Balança Rolha vende abadás, a segurança dos foliões deve ser de sua responsabilidade.
Deve-se saber que não pode ocorrer a privatização do espaço público de modo algum.
Principalmente em eventos ocorridos no período carnavalesco, pois esta festa é tradicional e atrai, em todo o seu período, milhares de pessoas de diversos segmentos sociais.
Ivete Sangalo não é Maria da Vila, é Ivete Sangalo.
Portanto, a direção do Balança Rolha, a Prefeitura do Recife e o governo do Estado sabem que ela atrai multidão.
Então, a festa, sendo realizada com cordão de isolamento não deveria ter sido autorizada.
Pois este cordão, no espaço público, evidencia claramente que a Avenida Boa Viagem foi privatizada, por certo período de tempo, pelo Balança Rolha.
A cena é dramática: jovens desejosos para se aproximar de Ivete.
No entanto, circulando o trio, onde está Ivete, um cordão de seguranças “preparados”.
Esses protegiam jovens que compraram abadás, mas que desejam, também, a segurança das polícias.
Portanto, dois “tipos” de foliões estão presentes no espaço público: os com abadás e os sem abadás.
Certamente, um conflito ocorrerá.
Soma-se a isso o fato de que a PM, assim com a secretaria de Defesa Social, não deve ser responsabilizada por completo pela segurança de um evento como este.
O volume de pessoas reunidas em um delimitado espaço geográfico, a presença de bebidas alcoólicas e a participação maciça de jovens formam uma bomba relógio, a qual, a qualquer momento, pode explodir.
Portanto, o desfile do Balança Rolha não deveria ter sido autorizado.
Neste Carnaval, as polícias devem ser responsáveis por todo evento não pago realizado em espaço público.
Os eventos privados devem contar com a ação coercitiva do Estado na parte externa do local onde ocorrem.
A segurança interna deve ser da responsabilidade do organizador do evento.
Quando policiais prestam segurança em eventos privados, onde lá estão pessoas que podem pagar, as áreas de baixa densidade socioeconômica ou as festividades não pagas que ocorrem em espaços públicos ficam sem segurança.
Portanto, a prioridade deve ser dada à maioria, e quem é esta: os que não podem pagar ou optam por isto.
Espero que os jornalistas “republicanos”, mas de classe média, que, indiretamente, defendem o apartheid social, inclusive no Carnaval, reconheçam que todos têm direito a policiamento, inclusive aqueles que não optam ou não têm recursos para comprar abadás.
Os parlamentares devem cobrar mais ação do governador quanto ao considerável quantitativo de pessoas assassinadas em comunidades pobres da Região Metropolitana do Recife.
E a direção do Bloco Balança Rolha deve realizar seus próximos encontros em espaços privados.
Infelizmente, os jornais noticiaram no dia 06/02/2007, 42 pessoas assassinadas em Pernambuco.
Contudo, a agenda da mídia ainda era: “Faltaram policiais para Ivete.” Fico espantado, mas compreendo, pois Ivete precisa de polícia, mas Maria da Vila não, pois é pobre, e, por conseqüência, não tem como comprar abadás para os seus filhos.
Adriano Oliveira é doutor em ciência política.