Do site Comunique-se Jornalista não costuma se surpreender facilmente.
Mas um fato no último final da semana pegou muitos no contrapé: o ex-ministro chefe da secretaria de comunicação do governo Luiz Gushiken enviou um e-mail ao diretor da Polícia Federal, delegado Paulo Lacerda, denunciando uma suposta operação da imprensa para difamá-lo, e solicitava uma investigação.
No texto, são citados os colunistas Lauro Jardim e Diogo Mainardi, da revista Veja, e o editor Leonardo Attuch, de IstoÉ Dinheiro.
Também incomum foi a forma como a correspondência tornou-se pública: reproduzida, com autorização do remetente, no site do jornalista Paulo Henrique Amorim, o Conversa Fiada, sob o título “Gushiken cobra providências da PF”.
O ex-ministro afirma já ter enviado ofício para a Polícia Federal em setembro de 2006 sobre o complô da mídia, citando reportagem de Veja com um dossiê de contas de integrantes do governo no exterior.
Lembra também atos de espionagem e suborno promovidos pela empresa Kroll Associates, e que a Veja e CartaCapital teriam apontado Leonardo Attuch como um dos subornados.
Agora, o ex-ministro apresenta novas informações.
Cita nota de Lauro Jardim, que teria informado erroneamente os valores de um jantar, e comentário de Diogo Mainardi sobre o assalto em sua casa.
Gushiken diz no e-mail ter tomado providências legais por ser sentir difamado pelas reportagens, o que pode ser feito por qualquer cidadão.
O que Gushiken não explica é por que ele pode se dirigir diretamente para a maior autoridade da Polícia Federal e cobrar providências.
O que certamente não pode ser feito por qualquer cidadão.
Mainardi “Talvez ele pense que este seja os meios jurídicos que dispõe”, afirma Mainardi. “Eu acho que o Gushiken está tomando providências antecipadamente.
Ele teme algo que possa surgir vindo da Itália.
Está disparando para todos os lados”, continua.
Do território italiano, o que pode surgir é informação relacionada à prisão de 20 pessoas por corrupção e espionagem, todas ligadas à empresa de telecomunicações Telecom Italia.
Um dos presos, Marco Bernardini, revelou à justiça italiana que o grupo atuou no Brasil, especialmente em 2004 e 2005, e que foram gastos U$ 2 milhões para pagar políticos e jornalistas brasileiros.
Mainardi diz que, por ter morado muitos anos na Itália e ter o hábito de ler os jornais do país, foi um dos primeiros na imprensa brasileira a tratar do assunto.
Ele frisa que esta preparação de Gushiken é uma suposição e que não teme uma investigação da Polícia Federal. “Como profissional, isso não me afeta minimamente.
Só uso fontes que podem ser apresentadas em tribunais.
E não ficaria surpreso se estivessem fuçando os meus dados ou grampeando meus telefones.
Escolhemos essa profissão assim como escolhemos nossos políticos.
Agora, tenho interesse como cidadão.
Isso é um abuso de poder político.
Qual base legal a polícia está usando para investigação?”, pergunta Mainardi, lembrando que há jornalistas brasileiros investigando na Itália.
Attuch Leonardo Attuch foi um dos que esteve em Milão recentemente, apurando dados sobre a atuação da Telecom Italia junto a jornalistas e políticos brasileiros, que renderam matéria na última edição de Istoé.
Attuch é citado no e-mail de Gushiken como um dos profissionais subornados e também acha que o ex-ministro se prepara para algo que pode vir do país europeu. “O Gushiken quer desqualificar por antecipação.
O que o assusta é o que está vindo da Itália.
Tem muita coisa por lá”, diz.
Attuch aponta ligações do e-mail de Gushiken com a Operação Chacal, que desvendou o esquema de espionagem da Kroll e do grupo Opportunity. “O objetivo verdadeiro da Operação, e não declarado, era promover uma troca de controle da Brasil Telecom.
E ele foi concretizado.
Em vez de nos pautarmos pelo governo, publicamos o que realmente estava acontecendo”, afirma o jornalista. “A CartaCapital, pela qual Gushiken tem grande apreço, publicou um e-mail falso para me desqualificar.
E Veja, pela qual Gushiken já teve grande apreço, não só incentivou a Operação Gutemberg da Polícia Federal contra mim, como também fez uma série de ataques - em função disso, eles já foram condenados a me indenizar em primeira instância”, completa.
Attuch também chama atenção para o fato da correspondência de Gushiken ter sido divulgada em um site do IG, que pertence à Brasil Telecom.
Sobre uma possível investigação da Polícia Federal, Attuch diz não temê-la. “Só acho curioso que eu, Diogo Mainardi e Lauro Jardim estejamos no mesmo barco agora”, afirma. “Dessa vez, todos estamos na mesma situação”, confirma Mainardi.
Polícia Federal A Divisão de Comunicação Social confirmou, na tarde de terça-feira, ter recebido o e-mail de Gushiken e encaminhado para o delegado Paulo Lacerda.
O agente chefe da divisão, Bruno Ramos Craesmeyer, faz questão de deixar claro que já há um inquérito aberto na Polícia Federal a respeito das contas no exterior levantadas por Veja.
Craesmeyer não tinha ainda como informar o que exatamente será feito a partir do e-mail de Gushiken, mas deixou claro a competência do órgão em que trabalha. “Polícia investiga crime e criminoso.
Quem não está envolvido com uma coisa nem outra não tem com o que se preocupar”, argumenta.
O Comunique-se tentou ouvir o principal personagem desta matéria, Luiz Gushiken, mas ele não respondeu os contatos feitos no e-mail cedido pelo governo até o fechamento.
Lauro Jardim não pôde ser localizado.