A recente homenagem de entidades e organizações sociais ao ex-procurador-geral de Justiça de Pernambuco, Francisco Sales, é emblemática: ela chama atenção para um tempo em que o Brasil inteiro passa por um processo de depuração e em que o Ministério Público tem papel extraordinário.
A homenagem distingue o cidadão e servidor público, tanto quanto realça a instituição com responsabilidade constitucional de fiscal da lei.
Francisco Sales deixou o cargo de procurador-geral depois de o ter exercido com firmeza, como a manifestação da instituição e, dessa forma, sempre esteve sujeito a cr?ticas, como é próprio de um estado democrático de direito.
Um desses momentos de confrontação se dá exatamente quando deixa a Procuradoria-Geral, submetendo alguns prefeitos aos rigores da lei.
São aspectos que devem ser vistos com prudência, para que as versões não se imponham aos fatos. É um fato, por exemplo, que cabe ao Ministério Público a ação fiscalizadora da atividade municipal, exigindo o cumprimento da lei.
Silenciar perante irregularidades é prevaricar, faltar com o dever, o que implicaria em responsabilizar o agente público omisso.
Assim, antes de encarar o rigor de procuradores e promotores de Justiça como arrogância ou “desejo de aparecer???, é fundamental que se entenda que eles não podem, legalmente, agir de maneira contrária.
No caso dos prefeitos e da gritaria da Associação Municipalista de Pernambuco, Amupe, cabe, também, advertir para a responsabilidade de servidores públicos eventualmente portadores de mandatos.
Procuradores, promotores de Justiça e magistrados cumprem o que diz a lei.
Se os agentes pol?ticos entendem que eles vão além de suas atribuições legais, que usem a lei ou trabalhem para mudá-la.
Uma delas – a de responsabilidade fiscal – é a que mais tem infernizado a vida de administradores, mas é o maior avanço em matéria de administração pública em toda a história da República.
Perante a lei de responsabilidade fiscal, é dever do Ministério Público pedir ao Judiciário que puna os que forem contra o que dispõe a norma legal, produzida para instalar a moralidade no Pa?s.
O procurador – ou promotor de Justiça – não pode se valer de aparências, de suposições.
Quando faz a denúncia, ele deve ter base legal, prova.
Cabe ao lado denunciado produzir a contraprova, usar do direito constitucional do contraditório.
Tudo muito simples, linear.
Fora disso é o arb?trio ou o abuso do poder.
E quem conhece a história do ex-procurador-geral Francisco Sales assegura, por todos os santos, que ele seria incapaz de dar um só passo arbitrário ou abusar do poder.
Há, no entanto, um aspecto a considerar pelo lado dos prefeitos denunciados.
Sem deixar de lembrar a crônica da imoralidade administrativa que macula a história pol?tica brasileira, há de se considerar, também, que muitas vezes o rigor da lei desconsidera a vida.
Assim como o furto famélico pressupõe o abrandamento da letra fria da norma jur?dica, também se pode considerar que há prefeitos honestos, incursos na lei de responsabilidade fiscal porque são sensibilizados pela fome, pela miséria, pela doença, pelo desabrigo e tantos outros males que atingem nossas populações de exclu?dos.
Há de se entender, pois, que não têm razão a Amupe e os prefeitos em clamarem contra o procurador Francisco Sales.
Ele fez – e o Ministério Público tem que fazer – o que a sociedade brasileira exige: trabalhar pela limpeza de uma sociedade maculada pela corrupção.
O que podem os atingidos é cuidar para que a lei que faz o munic?pio funcionar tenha a força de uma lei constitucional nos moldes da norma que dá ao munic?pio a dimensão de um ente federativo, controlado pela fiscalização rigorosa mas, também, com autonomia e capacidade de ajustar a lei às condições da população.