Por Luiz Otavio Cavalcanti*Ex-secretário do Planejamento e da Fazenda de Pernambucolotavio@fsm.com.br O Parlamento, como instituição pol?tica, começou a assumir forma na época medieval.

A descentralização do poder real em direção aos espaços feudais possibilitou seu surgimento.

O primeiro passo foi a Revolução Gloriosa de 1688, na Inglaterra, contra o Rei.

Em seguida, no século XVIII, dois fatos consolidaram seu funcionamento.

De um lado, ocorreu a Revolução Francesa que se opôs ao rei de França e lançou, na força dos Estados Gerais, a idéia moderna da Assembléia Nacional.

De outro lado, surgiu a formulação democrática dos três Poderes, Executivo, Legislativo e Judiciário, elaborada por Montesquieu.

Ambos os movimentos se destinaram a contrabalançar o poder do Executivo e a garantir a defesa dos interesses do povo por meio da representação.

De lá para cá, a teoria democrática vem aperfeiçoando os instrumentos que fazem do Parlamento um emblema do interesse popular.

Por exemplo, os ingleses associam a capacidade de tributar do Estado com a necessidade de assegurar a representação pol?tica.

Eles costumam dizer: No taxation without representation (sem representação não há taxação).

Por sua vez, os americanos contribu?ram para aprimorar o processo de construção democrática de uma República federativa.

Seu conceito de Checks and balances busca fixar o equil?brio entre as funções desempenhadas pelos três Poderes, distinguindo o papel institucional atribu?do a cada um deles.

Acentua, de outra parte, a essencialidade de os três operarem de modo harmônico em benef?cio da estabilidade democrática.

Como se vê, na sua origem e no seu desenvolvimento posterior, o Parlamento tem se colocado próximo ao povo. É o Legislativo que contrasta o poder do Executivo.

E funciona como a última fronteira contra a tirania.

Nas crises, o Parlamento exibe sempre sua qualidade de legitimar ou não a vontade do Pr?ncipe.

Por isso, é de pasmar a falta de senso moral e de responsabilidade pol?tica de deputados e senadores de se autoconcederem aumento de subs?dios de 92%.

A inflação, no per?odo, foi de 24%.

E o aumento para os trabalhadores foi de 7%.

Além dos subs?dios, os parlamentares ainda recebem ajuda moradia de R$ 3 mil, verba para gabinete de R$ 53 mil e passagens aéreas.

No total, o custo de cada parlamentar é de R$ 100 mil. É pouco para a democracia.

E é muito para a decência pol?tica.

O exerc?cio de função pública requer de quem a ocupa um padrão de exemplaridade.

Quem a pratica deve carregar a leveza da ética pública e a convicção de atos morais.

Deve dar exemplo de contenção pessoal.

Para se ter idéia da demasia com que os parlamentares brasileiros cuidaram de seu próprio bolso, anote-se que eles percebem mais do que os parlamentares americanos.

Mas a economia norte-americana exibe PIB de US$ 12 trilhões.

E o Brasil um PIB de US$ 600 bilhões.De qualquer modo, a questão não é de PIB. É de atitude moral.

O deputado José Múcio, do PTB de Pernambuco, defendeu a iniciativa do aumento de 92% com o argumento de que “é preciso pagar bons salários para estimular os honestos a fazer vida pública???.

Com outro Congresso, até se poderia discutir a tese.

Mas, com o Congresso dos mensaleiros ?

E com o ex-presidente do PTB cassado por falta de decoro ?

Na Europa e nos Estados Unidos, a distância média entre o topo e a base de salários pagos no mercado varia entre 16 e 20 vezes.

A distância de remuneração entre um trabalhador brasileiro que ganha salário m?nimo e um parlamentar com o aumento recente é superior a 60 vezes.

Penso que sugestão prática para enfrentar essa matéria é grupo interpartidário elaborar projeto de Emenda Constitucional.

O projeto estabeleceria relação quantitativa máxima entre o que ganha o trabalhador de salário m?nimo e o que percebe um parlamentar. *Luiz Otavio Cavalcanti, 60, advogado, executivo e ex-secretário do Planejamento (1975/79 e 1991/92) e da Fazenda (1983/86 e 1992/93) de Pernambuco.

Recifense, Cavalcanti dirige hoje a entidade mantenedora da Faculdade Santa Maria. É autor, entre outros livros, de Como a corrupção abalou o governo Lula (Ed.

Ediouro, 2005), Administradores, quem somos nós? (Ed.

Bagaço, 2005) e Ensaiando Pernambuco (Ed.

Bagaço, 2005).