Por Fernando de Barros e SilvaNa Folha de São Paulo de hoje O aumento autoconcedido pelos parlamentares sacramentou o divórcio entre o Congresso e a sociedade, da qual o primeiro supostamente seria a "caixa de ressonância", como reza o clichê.
Essa caixa ressoa outra música.
A decisão deixa evidente -como se ainda fosse preciso- que os atuais congressistas há muito passaram do ponto em que prestar satisfações à opinião pública fazia parte de suas preocupações.
O que Fernando Gabeira (PV-RJ) chamou de "ato de inimizade com o povo brasileiro" suscita outras questões mais amplas: o que esses parlamentares representam?
Agem dessa forma em nome de quem?
E estão lá, afinal, para quê?
A democracia às vezes precisa de respostas.
Diante dos R$ 24,5 mil, ficamos entre a mente iluminada de um José Múcio (PTB-PE) -segundo quem os 91% vão evitar "fuga de cérebros do Congresso" e o risco de que haja "CPI com bandidos dos dois lados"- e a omissão sem brilho do presidente da Câmara, Aldo Rebelo, cada vez mais parecido com a hiena triste do desenho animado. Ó vida, ó céus, ó azar! -dizemos nós. É fato que o Congresso sempre foi fisiológico e corporativo.
As marcas dessa legislatura são a trivialização da bandalheira e a generalização da impunidade.
Entre os sanguessugas -três senadores e 69 deputados- não houve cassações, apenas duas renúncias.
E só três de 19 mensaleiros foram cassados.
A gestão Lula, que prometia mudar hábitos pol?ticos, colaborou para o apodrecimento do Legislativo.
A cúpula do PT patrocinou o maior esquema já visto de aluguel de deputados no varejo.
Apanhados, governo e partido nada fizeram para punir seus mensaleiros.
A mesma cultura desembocou no dossiê.
Vista em perspectiva, a eleição de Severino Cavalcanti, em 2005, foi a expressão sintomática do camelódromo em que a Câmara se transformara.
A farra do baixo clero que ele representava teve vida curta.
Mas o que representam hoje Aldo e Renan, senão a "severinização" do Congresso como instituição?