Por Luiz Otavio CavalcantiEx-secretário do Planejamento e da Fazenda de Pernambucolotavio@fsm.com.br Março de 2003.
Eleito presidente da República, Luis Inácio Lula da Silva continua a receber pressões da ala mais ideologizada do PT para praticar uma pol?tica agressiva de gasto público.
O propósito era acentuar o incremento da taxa de crescimento do PIB.
Relaxando os parâmetros de controle da inflação.
O presidente Lula resiste.
Recém-eleito, ele começa a sentir o peso do cargo.
Um intuitivo pol?tico, percebe que o ambiente de tranqüilidade social, essencial à governabilidade pol?tica, era fruto do baixo patamar inflacionário na economia.
Enxerga também que o fluxo de investimentos, que irriga a produção, depende da credibilidade de sua pol?tica de estabilidade econômica.
Dá força a Palloci no âmbito do governo, desvia os ataques desferidos pelo vice-presidente da República, contra Henrique Meireles, do Banco Central.
E segue firme na pol?tica de manter sob r?gida vigilância e proteção palaciana a pol?tica da moeda.
Traz para o Ministério da Fazenda um especialista em controlar despesa, Murilo Portugal.
E despolitiza a seara fazendária.
Troca o fervor ideológico pela rationale do mercado.
Lula podia ter cedido aos apelos dos que, pressurosos no poder, queriam avançar sobre as rubricas orçamentárias.
Não cedeu.
Podia ter perdido o senso de perspectiva do comando e ca?do na vaidade de autorizar obras e mais obras.
Não caiu.
Podia ter inaugurado uma pol?tica de troca de valores federativos com governos estaduais, contribuindo para o descumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal - LRF.
Não o fez.
Outubro de 2006.
O presidente-candidato, Lula, parte para a reeleição montado em trilogia social: Bolsa Fam?lia para os sem renda, inflação baixa para a pequena classe média e a mitificação binária, no imaginário popular, associando o metalúrgico humilde e o super homem pol?tico que alcançou a presidência da República.
Reelege-se com mais de 58 milhões de votos.
Candidato consagrado com maior número de votos no Ocidente, mais até do que Ronald Regan.
Na perfeita semana em que desfrutava o sabor indiz?vel de presidente reeleito, Lula é afrontado com declarações, desajuizadas e inoportunas, do ministro Tarso Genro e da ministra Dilma Roussef.
Os dois ministros, fora de sintonia com o chefe, defenderam a revogação da pol?tica de controle inflacionário, acentuando sua substituição por uma inefável pol?tica desenvolvimentista.
Anunciaram o fim da era Palloci.
O presidente, aborrecido, desautorizou os ministros, fazendo forte repreensão pública aos auxiliares.
Destacou que a orientação da pol?tica econômica era do chefe do governo.
Ela tem sua impressão digital.
Ordenou o fim do fogo amigo.
Disse que o que interessava agora era a “qu?mica do crescimento e não a discussão de conceitos teóricos superados.???
E para arrematar providências, antes de viajar à Bahia para descansar no feriado com a fam?lia, deixou com assessores um dever de casa: que preparassem proposta de crescimento de 5%, anuais, apoiada na premissa de que os investimentos tenham custo reduzido e não causem, sob nenhuma hipótese, inflação.
Novembro de 2006.
As medidas em estudo, voltadas para garantir crescimento anual do PIB de 5%, até 2010, sem inflação, abrangem um elenco de iniciativas de várias ordens.
Entre elas: 1.
Investimento público, elevar os atuais 20% para 24,5%;2.
Corte de gasto público, reduzir despesa corrente em 0,1% do PIB;3.
Previdência Social, diminuir gasto com benef?cios, regulamentar o Fundo de Previdência, combater as fraudes e melhorar a gestão do setor, e mudar as regras de idade m?nima;4.
Juros, promover a queda consistente da taxa nominal de modo que atinja 12% no final de 2007 (ou seja, 7,5% reais);5.
Marco regulatório, resolver bloqueios na área ambiental que impedem investimentos em infraestrutura.
Ao voltar de justo descanso, vitorioso e banhado pelas águas mornas das praias baianas, Lula traz na pele pedaços irradiados de sol tropical.
Tem a alma mais leve de quem soube se superar.
E cicatrizes desferidas pelos aloprados.
Na segunda-feira, sentado na mesa presidencial, Lula vai receber o plano que encomendou aos assessores.
Ele vai ler o t?tulo: Ensaio sobre a lucidez. *Luiz Otavio Cavalcanti, 60, advogado, executivo e ex-secretário do Planejamento (1975/79 e 1991/92) e da Fazenda (1983/86 e 1992/93) de Pernambuco.
Recifense, Cavalcanti dirige hoje a entidade mantenedora da Faculdade Santa Maria. É autor, entre outros livros, de Como a corrupção abalou o governo Lula (Ed.
Ediouro, 2005), Administradores, quem somos nós? (Ed.
Bagaço, 2005) e Ensaiando Pernambuco (Ed.
Bagaço, 2005).