Por Luiz Otavio Cavalcanti*Ex-secretário do Planejamento e da Fazenda de Pernambucolotavio@fsm.com.br Às vésperas de nova eleição presidencial, cabe indagar: como governam os pol?ticos brasileiros?
Qual seu estilo de decidir?
Quais são os condicionantes culturais de sua ação?
Gilberto Freyre, em "Ordem e Progresso", fixa a moldura social e as constantes culturais segundo as quais o pol?tico brasileiro incorpora e desenvolve sua visão no marco republicano.
Lá estão analisados a República de 89, a base econômica, a ordem social, a transição republicana e a Monarquia, o Exército.
E o tempo, na dimensão tr?bia de passado, presente e futuro.
Segundo ele, encontram-se na ordem republicana brasileira: .
Paternalismo pol?tico; .
Ambivalência pol?tica; .
Transição e evolução psicossocial; e .
Questão social.
As alterações sociais, pol?ticas e econômicas trazidas pela República foram m?nimas.
A prática republicana manteve o regime monárquico da ordem.
Autoridade numa sociedade que se desatava socialmente.
Esse pêndulo continuaria a funcionar em todo o século XX.
E constitui uma das chaves de modernização do Pa?s no século XXI.
Na verdade, o balé pol?tico de avanços e recuos, transigências e contemporizações, permanece até hoje.
Trata-se de cenário que mostra uma sociedade mais moderna, atualizada e consciente do que grande parte de suas lideranças pol?ticas.
O paternalismo das casas grandes sobreviveu em hábitos corporativos republicanos.
O presidente da República, algumas vezes, revivendo o poder moderador do Império.
A inscrição na bandeira nacional, Ordem e Progresso, retém o apego que militares, positivistas e o estabelecimento davam à manutenção de valores vigentes.
Na expressão de Freyre, revolucionários conservadores que, ao desejo de progredir, antepunham a conservação da situação dominante.
Essa ambivalência pol?tica é retrato três por quatro do baixo grau de accountability do sistema pol?tico.
De qualquer modo, ficamos mais próximos do padrão anglo saxão, de graduar reformas sociais dentro da ordem pol?tica.
E mais distantes do caudilhismo da América espanhola, que termina produzindo Hugo Chavez e Evo Morales.
Revolucionários conservadores, autoritarismo e democratização, Império um tanto república, República com verniz imperial, eis o resultado ambivalente da cultura pol?tica nacional.
No final, produz alternativas pol?ticas que são fruto da cultura tropical, morena, mesclada, tri cultural, ind?gena, branca e negra.
O resultado ?
A mediação pol?tica, o senso intermediário, o oposto do comandante espanhol, invasor na América, que queimou seus navios para incentivar os soldados a lutar já que não podiam mais voltar para a Europa.
Os brasileiros se adaptam lentamente às alterações pol?ticas e às mudanças sociais e econômicas.
Instinto da tri raça, efeito do clima, somos pacientes com as instituições, não queremos a regeneração nacional instantânea.
O súbito não é nossa praia social.
Vivemos psicologicamente o futuro, torcemos no otimismo confiante do que está por vir, embora estejamos sobrecarregados de passado.
Tempo psicológico, tempo social, tempo pol?tico, expectativa de futuro brilhante junto com as dores de parto de um presente med?ocre.
Adotamos o sentido de continuidade e não de ruptura.
Aqui, nenhum sistema é integralmente substitu?do por outro.
Na vida das instituições e na cabeça das pessoas a transição dura mais do que prazos administrativos.
As verdadeiras transformações "operam em ritmo que não é cronológico nem lógico, mas é principalmente psicológico, além de sociológico" (GF).
A relatividade dos tempos dissolve futuros em passados, deixando insignificantes os tempos presentes.
A não ser que o gesto, nascido da liberdade, afirme o contrário.
Por outro lado, não surge, durante todo o transcorrer do século XX, discussão séria e capacidade de ação no governo sobre a questão social no Pa?s.
Poucos pol?ticos se debruçaram seriamente sobre o assunto.
Fora as épocas de eleição.
E com a exceção honrosa de Joaquim Nabuco, conservador abolicionista que defendeu os negros e a educação, a reforma agrária e a liberdade.
Não há pol?tica firme e cient?fica de combate à pobreza no Brasil.
Os governos são estátuas de imobilismo e o Povo pobre espera.
A combinação cultural de ambigüidade pol?tica e paciência social mantém trinta milhões de brasileiros na linha das necessidades básicas. *Luiz Otavio Cavalcanti, 60, advogado, executivo e ex-secretário do Planejamento (1975/79 e 1991/92) e da Fazenda (1983/86 e 1992/93) de Pernambuco.
Recifense, Cavalcanti dirige hoje a entidade mantenedora da Faculdade Santa Maria. É autor, entre outros livros, de Como a corrupção abalou o governo Lula (Ed.
Ediouro, 2005), Administradores, quem somos nós? (Ed.
Bagaço, 2005) e Ensaiando Pernambuco (Ed.
Bagaço, 2005).