Por Inácio França*Jornalista e consultor do UNICEF Ao emergir da ditadura militar, na segunda metade dos anos 80, as forças pol?ticas brasileiras passaram a atuar num cenário completamente diferente daquele que existia no momento da submersão, em 1964.
Naquela época, as empresas de m?dia aceleravam o processo de consolidação que resultaria na atual onipresença.
Antes do golpe, não havia nada parecido com a Globo.
Sem contar os jornalões e revistas de variedades de circulação nacional.
Instrumentos do poder e, ao mesmo tempo, atores pol?ticos e econômicos com interesses próprios, os ve?culos de comunciação imediatamente se transformaram também no cenário, no “lugar??? onde a pol?tica acontece.
Desde 1989, não há como imaginar uma campanha presidencial num Pa?s do tamanho do Brasil sem a televisão.
Dá até para arriscar uma frase de efeito: é a TV que torna realmente nacional a campanha eleitoral, seja por meio da transmissão dos guias eleitorais, do noticiário ou da transmissão em rede das campanhas institucionais da Justiça Eleitoral.
A própria televisão se apresenta como palco da democracia, se oferece como campo neutro para a disputa.
Seus apresentadores proclamam que chegou o momento da nação, mais uma vez, discutir os grandes problemas nacionais.
Não há o que discutir quanto a esse aspecto: realmente, na democracia representativa, a eleição presidencial seria uma oportunidade imperd?vel para a discussão responsável e aprofundada dos grandes temas.
E a m?dia seria o meio apropriado para esses debates periódicos.
Sim, é poss?vel alcançar toda (ou quase) a população do Pa?s por meio da TV, do rádio e da m?dia impressa.
Mas a experiência acumulada em sete eleições para governador e cinco eleições presidenciais consecutivas demonstram que a discussão pol?tica é tão superficial e insossa quanto o programa do Ratinho.
A lógica da televisão - e da m?dia, em geral - limita a discussão e a transforma em mais show que se repete a cada quatro anos, como a Copa do Mundo.
Marketing pol?tico e publicidade comercial se confundem, este alimenta aquele.
O tempo da TV comercial é o mesmo tempo do debate pol?tico.
Pacotes são vendidos para os mesmos anunciantes do show business.
O resultado é um produto ralo, sem profundidade, onde as propostas e os discursos são, aparentemente, os mesmos.
Cada candidato fala aquilo que o público quer escutar naquele horário, repetindo o script encomendado ao redator.
E o debate não passa disso.
Meses depois das eleições, começam as cobranças no mesmo tom desprovido de racionalidade ou conteúdo.
Os debates ao vivo entre os candidatos, por exemplo, há muito tempo deixaram de ser interessantes.
Afinal, desapareceram as diferenças entre os participantes.
Quem assistiu ao embate entre o monstro vermelho Miguel Arraes e o usineiro da ditadura José Múcio, em 1986, por exemplo, sabe que não há mais espaço para improviso ou originalidade nos confrontos como o de hoje à noite, entre Mendonça, Humberto e Eduardo Campos.
O que vai ao ar, em 2006, é apenas mais uma atração sazonal da TV. É completamente imposs?vel discutir temas como segurança, saúde ou educação em três minutos de resposta e um minuto de réplica. É lógico que o candidato, por mais preparado e bem-intencionado, vai repetir as propostas pré-fabricadas.
Isso não quer dizer que a m?dia não seja a ferramenta capaz de amplificar a discussão sobre o Brasil.
O problema é que, com suas regras, não há qualquer possibilidade de aprofundá-la.
A sociedade e os pol?ticos precisam assumir a responsabilidade de conceber e impor uma nova lógica que vá além do telejornal, além do entretenimento, além dos três minutos e da mediação do apresentador.
Não dá para deixar tudo nas mãos de William Bonner e de S?lvio Santos.
A indústria da m?dia e seus profissionais não têm mandato para determinar como a população deve discutir e refletir sobre seu destino.
Isso cabe à sociedade civil e aos eleitos. *Inácio França é jornalista formado pela Universidade Católica de Pernambuco, em dezembro de 1990.
Repórter de Pol?cia do Diário Popular (SP), atual Diário de São Paulo.
Repórter de O Globo, sucursal de São Paulo.
Repórter de O Globo, sucursal de Recife.
Repórter-especial do Diário de Pernambuco.
Secretário de Comunicação de Olinda, durante a primeira gestão de Luciana Santos (PCdoB).
Atualmente, Consultor de Comunicação do UNICEF para os estados de Alagoas, Para?ba e Pernambuco.
Como repórter, conquistou o Prêmio Vladimir Herzog de Jornalismo e Dieitos Humanos, Prêmio Cristina Tavares de Jornalismo.