Por Túlio Velho Barreto*Cientista pol?tico e pesquisador da Fundaj Na última quinta, dia 17, participei de um chat promovido pelo JC OnLine (www.jc.com.br) sobre as eleições de 2006, em especial acerca dos programas eleitorais gratuitos no rádio e na TV.
O guia eleitoral começara apenas dois dias antes e uma das questões mais recorrentes levantadas pelos internautas foi sobre a utilização de imagens e áudios do presidente-candidato Lula (PT) no guia da União por Pernambuco (PMDB, PFL, PSDB e PPS) e de seu candidato ao Governo do Estado, Mendonça Filho (PFL).
Na ocasião, expus minha posição a respeito.
Aqui, pretendo fazer uma análise mais apurada sobre o tema, que se transformou na primeira batalha envolvendo as diversas coligações estaduais, e até a disputa nacional, na medida em que envolveu diretamente o presidente-candidato Lula.
De fato, a utilização de imagens e áudios de Lula nos primeiros programas do guia da União por Pernambuco, apesar de esperada, não deixou de causar certa perplexidade nos eleitores mais atentos e nos analistas pol?ticos.
E a razão é óbvia.
Como sabemos, os principais partidos que integram a União por Pernambuco são exatamente os que mais combateram o Governo Lula no plano nacional, mas também local.
E suas principais lideranças individuais cerraram trincheiras no pelotão de frente dos que denunciaram e se dispuseram apurar, no Congresso Nacional, o que se convencionou chamar de "escândalo do mensalão" e "escândalo dos sanguessugas", por exemplo.
E tais escândalos envolveram dezenas de parlamentares da base do Governo Lula (PT, PP e PTB, principalmente), mas também alguns da oposição (PSDB e PFL, em bem menor escala).
Além de alguns dos principais assessores do presidente Lula e de seu Governo (José Dirceu, Antônio Palocci, Luiz Guishken, Paulo Okamoto, entre outros), e l?deres de seu partido (José Geno?no, Delúbio Soares, S?lvio Pereira, entre outros).
Em Pernambuco, desde que foi reeleito governador, em 2002, o agora candidato ao Senado pela União por Pernambuco, Jarbas Vasconcelos (PMDB), apresentou-se como adversário do Governo Lula, o anti-Lula, mantendo esta posição durante todo o seu segundo governo, que coincidiu com o Governo Lula, apesar da relação amistosa pessoal e administrativa mantida entre os dois.
Assim, o ex-governador terminou por assumir a liderança dos peemedebistas refratários à participação do partido no Governo Lula e, mais recentemente, na aliança nacional, tão desejada pelo presidente Lula, entre o PMDB e o PT, visando exatamente às eleições de 2006.
E mais: entre as lideranças mais atuantes no Congresso Nacional no processo de apuração do chamado "escândalo do mensalão" estavam dois senadores pernambucanos, Sérgio Guerra (PSDB) e José Jorge (PFL), que agora são, respectivamente, coordenador da campanha de Geraldo Alckmin (PSDB), candidato à Presidência da República, pela aliança PSDB e PFL, portanto, adversário do candidato Lula, e candidato a vice-presidente exatamente na chapa encabeçada por Alckmin.
E não raras vezes, embora não tenham sido os únicos, se referiram ao presidente Lula como "chefe do mensalão".
E chagaram a afirmar, também em mais de uma oportunidade, perante as câmaras de televisão e dos telespectadores-eleitores, que o presidente Lula sabia de tudo o que estava ocorrendo em seu Governo, "o mais corrupto da história do pa?s".
Ora, diante do que foi exposto aqui, e do insistente uso das imagens e dos áudios do presidente Lula no guia da União por Pernambuco, das duas uma: ou a aliança estadual encabeçada pelo governador-candidato Mendonça Filho e pelo candidato a senador Jarbas Vasconcelos, nacionalmente representada pelo candidato a vice-presidente José Jorge e pelo coordenador de sua campanha, o senador Sérgio Guerra, está se penitenciando pelos excessos e as injustiças cometidos, e fazendo uma autocr?tica em relação ao papel que desempenhou durante o processo envolvendo os "mensaleiros", o que significaria perdoar o presidente Lula e seu Governo, ou se trata mesmo de imensurável e grave oportunismo pol?tico-eleitoral, resultado dos incr?veis ?ndices alcançados pelo presidente-candidato no Nordeste, mas, sobretudo, em Pernambuco, que ultrapassa, segundo diversos institutos de pesquisas, a casa dos 65% e 70%, respectivamente.
E não vale o argumento de que há precedentes, pois a instrumentalização da racionalidade pol?tica não pode servir aos que comentem il?citos e aos que dizem combatê-los.
Lula e João Paulo no guia da União: bom para ambos; ruim para Humberto A análise que procurei fazer com relação à utilização de imagens e áudios do presidente Lula no guia da União por Pernambuco ficaria incompleta se não tratasse dos dois lados da moeda.
Na verdade, se alguém sai ganhando com tal uso, alguém sai perdendo, pois este não é necessariamente um jogo de soma zero para todos os envolvidos.
Procurarei explicar melhor.
Com efeito, é preciso dizer que o uso das referidas imagens e áudios favoreceram, em um primeiro momento, a União por Pernambuco, que pôde, ainda que temporariamente, "surfar" na popularidade do presidente Lula, ao esconder literalmente o seu débil palanque nacional, formado por Geraldo Alckmin e José Jorge.
Mas contribu?ram para reforçar ainda mais a candidatura de Lula.
De fato, de já contar com os dois palanques da oposição estadual (Humberto Costa/Melhor para Pernambuco e Eduardo Campos/Frente Popular de Pernambuco), a candidatura do presidente contou com preciosos segundos nos guias da União por Pernambuco.
E, conseqüentemente, beneficiou-se indiretamente da também grande popularidade do candidato ao Senado daquela coligação, o ex-governador Jarbas Vasconcelos.
Como o presidente-candidato Lula preferiu não optar pelo candidato de seu partido, Humberto Costa (PT), e apóia formalmente também Eduardo Campos (PSB), ambos seus ex-ministros - o que, como já disse em artigo anterior, no meu entendimento, é bom para o palanque de Lula, mas muito ruim para a oposição estadual -, não é dif?cil imaginar que ele (Lula) não tenha se incomodado muito em aparecer em um terceiro guia.
No m?nimo, isto servirá para consolidar ainda mais sua vantagem no Estado, pois anula o palanque de seu principal adversário na corrida presidencial.
Se o presidente-candidato Lula não tem tanto tempo para pensar sobre tais questões, o mesmo não se deve dizer do prefeito João Paulo, coordenador da campanha de Humberto Costa e um dos coordenadores estaduais da campanha de Lula, ambos de seu partido, o PT.
Além do mais, foi o próprio prefeito que declarou a este Blog que não se sentia desconfortável em aparecer nos guias da União por Pernambuco, adversários da coligação Melhor para Pernambuco e de Lula.
Já escrevi a respeito, mas em outro lugar: por várias razões, o prefeito João Paulo, o nome mais forte e consistente que a oposição dispunha para a disputa estadual de 2006, participa desta eleição mirando as eleições estaduais de 2010.
Assim sendo, por que o prefeito deveria achar ruim aparecer também de forma farta e respeitosa nos guias da situação, já que está nos guias da oposição?
Não faria mesmo sentido sentir-se de outra forma, se, no presente, isso lhe propicia mais visibilidade, e, no futuro próximo (leia-se: 2010), poderá lhe dar mais legitimidade, independente do PT, que lhe negou tal condição agora.
Por isso, vale a pena indagar: será que uma hipotética vitória de Mendonça Filho em 2006 implicará mesmo na derrota de todos os que compõem a oposição no Estado?
Embora seja prematuro responder, lembro que, mesmo mantido o instituto da reeleição, Mendonça Filho não poderá disputar as próximas eleições para o Governo do Estado (2006).
Mas o mesmo não ocorreria em uma hipotética vitória de Humberto Costa ou Eduardo Campos, pois ambos estariam aptos a concorrer à reeleição em 2006.
O que isso significa?
Ora, considerando que os atores pol?ticos costumam agir racionalmente de forma mais ego?sta e menos altru?sta, sobretudo quando envolvidos em disputas que podem implicar em sua sobrevivência, é absolutamente plaus?vel inferir que a vitória de Mendonça Filho não implicará em uma derrota, pelo menos em termos absoluta, do prefeito João Paulo.
Muito pelo contrário.
Neste cenário, conclu?da a apuração, o prefeito passaria a ser, desde que mantidas as condições pol?ticas atuais, em especial se o presidente Lula for reeleito, o mais forte, se não o único, candidato natural da oposição à sucessão estadual em 2010, mesmo que o PT não queira.
A esta altura de sua vida pública, já um pol?tico testado e experiente, o prefeito João Paulo sabe bem disso. *Cientista pol?tico e pesquisador da Fundação Joaquim Nabuco, Túlio Velho Barreto, 48, é um dos autores dos livros Democracia e Instituições Pol?ticas Brasileiras no final do Século XX (MCP-UFPE/Bagaço, 1998) e Nordeste 2004 - O Voto das Capitais (Fundação Konrad Adenauer, 2005).
Organizou e participou dos livros Na Trilha do Golpe - 1964 revisitado (Editora Massangana, 2004) e A Nova República - Visões da Redemocratização (Cepe/JC, 2006), que resultaram de séries especiais publicadas pelo Jornal do Commercio em parceria com a Fundação Joaquim Nabuco.