Por Maria Alice AmorimJornalista e pesquisadora Cordel, barbante, cordão.

Instalados assim, quase soltos ao vento, escanchados em barbante, os folhetos da literatura popular brasileira, conhecidos como livrinho ou "folhete", foram circulando de boca em boca, de feira em feira, até chegarem ao pedestal de livro-objeto de arte, objeto de cobiça de pesquisadores e bibliófilos.

Fruto da persistência de culturas de oralidade e da convergência de motivos literários de séculos passados, o folheto popular, ou a literatura de cordel, expressão regional brasileira que interessa a pesquisadores de todo o mundo, é uma junção de tradição literária herdada da Pen?nsula Ibérica associada a invenção/reinvenção de temas e aglutinação de formas fixas chegadas com o romanceiro português e outras manifestações de poesia.

Esta literatura, que, em terras lusas, podia ser texto teatral, narrativa ficcional em prosa ou em verso, tomou feição própria ao se fixar no Nordeste brasileiro.

Entre nós, cordel significa poesia, com rima e métrica, impressa em folhetos de tamanho em torno de 11 x 16 cent?metros, e que trata, sobretudo, de temas regionais e/ou temáticas relacionadas a histórias tradicionais seculares transmitidas entre gerações.

As formas fixas da versificação freqüentemente utilizada pelos cordelistas são a sextilha (estrofe de seis linhas), a setilha (estrofe de sete linhas), a décima (estrofe com dez linhas).

A métrica usual é a redondilha maior, ou linha de sete s?labas, e a rima tradicional nessa produção poética é ABCBDB (na sextilha), ABCBDDB (na setilha) e ABBAACCDDC (na décima).

Com oito e dezesseis páginas, chama-se folheto, e a temática explorada diz respeito ao dia-a-dia, not?cias de jornal, assuntos diversos relacionados também com a fabulação.

Os folhetos de 24, 32 ou 64 páginas são os romances, aqueles em que predomina a narrativa ficcional relativa a temas amorosos, heróicos e épicos.

Os ciclos temáticos no cordel repetem certos assuntos recorrentes na poesia folclórica, como o ciclo do boi, do diabo, as lendas populares, a cachaça, dramas de amor, apologia a ações e personagens heróicos, amarelinhos do tipo de Pedro Malazartes.

Mas, praticamente todos os temas são regionalizados, mesmo os que foram importados da tradição ibérica e outras tradições ancestrais.

A princesa Magalona, Carlos Magno e os doze pares de França, a donzela Teodora são algumas das novelas tradicionais impressas aqui sob a forma de folheto.

Um dos importantes ciclos é o que diz respeito às not?cias de jornal e à pol?tica.

Autores às vezes são contratados para narrar as façanhas de algum governante.

Entretanto, há cordelistas que tratam de tais temas pol?ticos como uma forma de se posicionar no mundo, como uma tribuna em que falam mais alto o protesto, a inconformidade, o exerc?cio da cidadania.